A devoção a São Pantaleão, um dos mártires mais venerados da Igreja nos primeiros séculos do Cristianismo, encontra um eco especial na cidade do Porto, onde é reconhecido como padroeiro secundário. A sua história mistura elementos históricos e hagiográficos, transmitidos ao longo dos séculos, reforçando a figura de um médico convertido e mártir da fé cristã, cuja intercessão continua a ser invocada até aos nossos dias.
Origem e vida de São Pantaleão
São Pantaleão nasceu na cidade de Nicomédia, na Bitínia (actual Turquia), por volta do ano 275. Era filho de um pagão rico, Eustóquio, e foi educado na medicina, tornando-se um médico talentoso e muito respeitado. A sua formação espiritual foi orientada por Hermolau, um sacerdote cristão que o evangelizou e o baptizou.
Após a sua conversão, Pantaleão decidiu dedicar os seus conhecimentos médicos à prática da caridade, oferecendo os seus serviços gratuitamente aos pobres, como forma de testemunhar a fé cristã. O seu nome, que significa “tudo misericórdia” ou “plenamente compassivo”, reflete essa entrega ao serviço do próximo.
Martírio e testemunho
Durante a perseguição aos cristãos sob o imperador Diocleciano, São Pantaleão foi denunciado por curar em nome de Cristo. Recusando-se a renegar a fé, foi preso, torturado e condenado à morte. Segundo a tradição, foi submetido a várias formas de tortura — fogo, roda, chumbo derretido, entre outras — mas sobreviveu milagrosamente a todas, até ser finalmente decapitado, por volta do ano 305.
O seu sangue, recolhido por fiéis, começou a ser venerado como relíquia, e vários milagres foram atribuídos à sua intercessão ao longo dos séculos. É por isso considerado um dos Santos Anárgiros, ou seja, “santos sem prata”, médicos que ofereciam os seus serviços gratuitamente, à semelhança de São Cosme e São Damião.
Devoção em Portugal e no Porto
A devoção a São Pantaleão espalhou-se rapidamente pelo Oriente e depois pelo Ocidente, especialmente na Idade Média. Em Portugal, o culto foi introduzido com o crescimento da Igreja após a Reconquista, tendo-se enraizado em várias localidades.
Na cidade do Porto, São Pantaleão é venerado como padroeiro secundário, a par de Nossa Senhora da Vandoma. A sua imagem é conservada e venerada na Igreja de São Pantaleão, situada na freguesia da Sé. Esta devoção foi alimentada durante séculos por médicos, cirurgiões e farmacêuticos, que o invocavam como protector e intercessor nas suas práticas.
Relíquias e património
A cidade do Porto possui relíquias atribuídas a São Pantaleão, que eram expostas com grande solenidade em ocasiões festivas, sobretudo no dia da sua festa litúrgica, a 27 de Julho. Essas celebrações incluíam procissões, missas solenes e bênçãos aos doentes, reforçando a ligação entre a figura do santo e a cura física e espiritual.
A igreja dedicada ao santo no Porto conserva tradições devocionais muito antigas, incluindo novenas e orações específicas. A sua imagem é representada frequentemente com vestes de médico da Antiguidade, segurando uma caixinha de ungüentos e a palma do martírio.
São Pantaleão e a medicina cristã
Ao longo dos séculos, São Pantaleão foi reconhecido como patrono dos médicos e profissionais da saúde. A sua vida mostra como a ciência médica e a fé cristã podem caminhar juntas ao serviço da dignidade humana. A Igreja propõe o seu exemplo como testemunho de que a caridade e a misericórdia devem estar no centro de qualquer vocação profissional, especialmente na área da saúde.
A sua intercessão é frequentemente invocada por pessoas doentes e por aqueles que cuidam delas, especialmente em tempos de pandemia ou dificuldades sanitárias, reforçando a actualidade da sua figura no mundo contemporâneo.
Conclusão
São Pantaleão é uma figura luminosa na história da santidade cristã. Médico convertido, mártir da fé e padroeiro da cidade do Porto, o seu exemplo continua a inspirar gerações de crentes. A sua vida testemunha que a verdadeira cura vai além da medicina: nasce do amor, da fé e da entrega generosa aos outros.
A devoção a São Pantaleão convida os fiéis a unir fé e ciência, oração e acção, confiança em Deus e solidariedade com os mais frágeis. O Porto, ao tê-lo como um dos seus padroeiros, guarda a memória de um homem santo que fez da misericórdia o centro da sua vida.