Santo Anselmo, o doutor magnífico da Igreja

Santo Anselmo de Cantuária (1033-1109) foi um dos maiores teólogos e filósofos da Idade Média, sendo considerado o pai da Escolástica. A sua obra teve um impacto profundo na teologia cristã, sobretudo pelo seu argumento ontológico sobre a existência de Deus e pela defesa do primado da fé sobre a razão. Além disso, destacou-se como arcebispo de Cantuária, enfrentando duros conflitos com o poder político em defesa da liberdade da Igreja. Foi canonizado em 1494 e declarado Doutor da Igreja pelo Papa Clemente XI em 1720. A sua festa litúrgica celebra-se a 21 de abril.

Juventude e vida religiosa

Anselmo nasceu em Aosta, no atual norte de Itália, por volta do ano 1033. Desde cedo demonstrou grande inteligência e sede de conhecimento, mas a relação tensa com o pai levou-o a abandonar a casa familiar e a percorrer a França em busca de formação. Em 1059, ingressou na Abadia de Bec, na Normandia, um importante centro de estudos filosóficos e teológicos, onde estudou sob a orientação do renomado teólogo Lanfranco de Pavia.

Rapidamente destacou-se pela sabedoria e piedade, sendo nomeado prior da abadia em 1063 e, mais tarde, abade em 1078. Durante esse período, escreveu algumas das suas obras mais influentes, explorando a relação entre fé e razão e formulando o célebre argumento ontológico para a existência de Deus.

O argumento ontológico e contribuição filosófica

Santo Anselmo é mais conhecido pelo argumento ontológico, apresentado na obra Proslogion, onde afirma que Deus é “aquilo maior do que o qual nada pode ser pensado”. Segundo ele, mesmo o ateu que nega Deus compreende esse conceito, e, se Deus existe na mente, então deve existir também na realidade, pois a existência real é maior do que a mera existência mental.

Além disso, desenvolveu a ideia de que a fé precede a razão, mas que a razão deve ser usada para compreender e aprofundar a fé (Fides quaerens intellectum – “A fé que busca o entendimento”). Essa abordagem marcou profundamente o pensamento escolástico e influenciou grandes teólogos como São Tomás de Aquino.

Arcebispo de Cantuária e conflitos com o rei

Após a morte de Lanfranco, Santo Anselmo foi nomeado arcebispo de Cantuária em 1093, assumindo a liderança da Igreja na Inglaterra num período de grandes tensões entre o poder real e a autoridade eclesiástica. O rei Guilherme II e, posteriormente, Henrique I tentaram impor o direito de nomear bispos e controlar os bens da Igreja, o que Anselmo resistiu veementemente.

A sua defesa da liberdade eclesiástica custou-lhe o exílio por duas vezes. Durante esses períodos, viajou para Roma e obteve o apoio do Papa, reforçando a doutrina da supremacia do poder espiritual sobre o temporal. Apesar dos conflitos, nunca abandonou a postura de humildade e serviço, procurando sempre a reconciliação entre a Igreja e a monarquia.

Últimos anos e canonização

Nos últimos anos, Anselmo dedicou-se a consolidar as reformas eclesiásticas na Inglaterra e a escrever sobre temas como a natureza do pecado e a redenção. A sua obra Cur Deus Homo? (Por que Deus se fez homem?) apresenta uma das primeiras explicações sistemáticas da doutrina da Redenção, argumentando que a Encarnação de Cristo foi necessária para restaurar a justiça divina.

Faleceu a 21 de abril de 1109, sendo lembrado como um pastor zeloso, um grande pensador e um defensor incansável da Igreja. Em 1494, foi canonizado e, em 1720, recebeu o título de Doutor da Igreja.

Conclusão

O legado de Santo Anselmo estende-se por diversas áreas da teologia e da filosofia. O seu pensamento influenciou a Escolástica, abriu caminho para o uso da razão na compreensão da fé e ajudou a consolidar doutrinas essenciais do cristianismo. Além disso, a sua coragem na defesa da liberdade da Igreja inspirou gerações de bispos e líderes religiosos.

Hoje, é lembrado como um modelo de intelectualidade e espiritualidade, demonstrando que fé e razão não são opostas, mas complementares. A sua vida e obra continuam a iluminar a procura pela verdade e a fortalecer a identidade cristã.

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