O que são indulgências e como obtê-las

As indulgências são uma prática da Igreja Católica que envolvem a remissão parcial ou total das penas temporais devidas pelos pecados já perdoados em confissão. De acordo com a doutrina católica, o sacramento da confissão absolve o pecado, mas as consequências desse pecado permanecem na forma de uma dívida temporal, que deve ser expiada. A indulgência é uma forma de encurtar ou eliminar essa dívida, concedida pela Igreja em nome de Cristo, que tem o poder de perdoar e aplicar o mérito dos santos e de Jesus Cristo a favor do fiel penitente.

Tipos de indulgências

Existem dois tipos de indulgências:

  • Indulgência parcial: Reduz parte da pena temporal.
  • Indulgência plenária: Remite toda a pena temporal devida ao pecado.

Quando e por que foram instituídas?

A prática das indulgências tem raízes profundas na história da Igreja, sendo baseada na crença na comunhão dos santos, que reconhece que o mérito de Cristo e dos santos pode ser aplicado em favor de outras almas. Embora traços da ideia de indulgência possam ser encontrados desde os primeiros séculos do cristianismo, o conceito começou a formalizar-se na Idade Média, especialmente a partir do século XI.

A prática de conceder indulgências ganhou relevância no contexto das Cruzadas, no século XI, quando a Igreja concedia indulgências plenárias aos cruzados que combatiam para defender a Terra Santa. Era uma forma de incentivar a participação, oferecendo não só uma recompensa espiritual, mas também a certeza da remissão total das penas temporais.

No entanto, a prática começou a expandir-se, especialmente no século XIV, quando as indulgências começaram a ser usadas para a construção de igrejas e obras de caridade. Esta prática culminou no século XVI, durante o pontificado do Papa Leão X, quando as indulgências foram vendidas para financiar a construção da Basílica de São Pedro em Roma.

Controvérsias sobre as indulgências

As indulgências tornaram-se altamente controversas, particularmente no início do século XVI, quando começaram a ser vendidas em troca de dinheiro, prática conhecida como simonia. A promessa era que, ao comprar indulgências, o fiel poderia reduzir o tempo das suas penas no purgatório ou garantir o perdão para os entes queridos falecidos.

A controvérsia em torno das indulgências foi um dos principais fatores que levaram à Reforma Protestante, liderada por Martinho Lutero, que, em 1517, publicou as 95 teses, condenando a venda de indulgências e outros abusos na Igreja. Lutero criticava a noção de que o perdão de Deus pudesse ser “comprado”, argumentando que apenas a fé em Cristo poderia salvar a alma. Ele via a venda de indulgências como uma corrupção espiritual e uma exploração dos fiéis.

As práticas de indulgências também foram criticadas dentro da própria Igreja. Como resultado da Reforma Católica (ou Contrarreforma), no Concílio de Trento (1545-1563), a Igreja reafirmou a validade das indulgências, mas condenou explicitamente a venda e outras formas de abuso. O Concílio estabeleceu normas rígidas sobre como e em que circunstâncias as indulgências poderiam ser concedidas, sempre ligadas à confissão e à verdadeira conversão do coração.

Condições para receber indulgências

Para receber indulgências, é necessário cumprir uma série de requisitos estabelecidos pela Igreja Católica. As indulgências podem ser parciais (reduzindo parte das penas temporais) ou plenárias (remissão total das penas). Seguem os principais passos para obter indulgências:

  1. Estado de Graça
    O fiel deve estar em estado de graça, o que significa que precisa ter confessado todos os pecados graves (mortais) através do Sacramento da Reconciliação (Confissão).
  2. Intenção
    Deve haver a intenção explícita de obter a indulgência. Isso significa que o fiel, ao realizar as obras ou orações associadas a uma indulgência, deve estar ciente e desejar sinceramente receber esse dom espiritual.
  3. Cumprir as Obrigações
    A indulgência é concedida ao realizar as obras ou orações específicas ligadas a ela. Alguns exemplos comuns incluem:
    • Rezar o Rosário numa igreja, numa capela, ou em família.
    • Visitar uma igreja no dia da festa do santo padroeiro.
    • Adorar o Santíssimo Sacramento por pelo menos meia hora.
    • Via Sacra (meditação das 14 estações da Cruz).
    • Leitura espiritual das Sagradas Escrituras por pelo menos meia hora.
  4. Comunhão Eucarística
    É necessário participar da Santa Missa e receber a Comunhão Eucarística no dia da indulgência ou próximo a esse dia.
  5. Oração pelas Intenções do Papa
    Deve-se rezar pelas intenções do Papa. As orações geralmente incluem um Pai-Nosso, uma Ave-Maria e uma Glória.
  6. Desapego de Todo Pecado
    Para que a indulgência seja plenária (remissão total da pena temporal), a pessoa deve estar completamente desapegada de qualquer pecado, até mesmo venial. Caso contrário, a indulgência será parcial.

Essas condições enfatizam que as indulgências não podem ser “compradas”, mas sim recebidas como fruto de verdadeira conversão e prática espiritual.

Exemplos de indulgências

Ao longo da história da Igreja, várias práticas e eventos têm sido associados à concessão de indulgências. Aqui estão mais exemplos de práticas e ações que podem conceder indulgências, tanto parciais como plenárias, de acordo com o Manual das Indulgências da Igreja Católica:

Exemplos de Indulgências Plenárias:

  • Adoração ao Santíssimo Sacramento: Recebe-se uma indulgência plenária ao adorar o Santíssimo Sacramento pelo menos durante meia hora, cumprindo as condições habituais.
  • Via Sacra (Via Crucis): Meditar nas 14 estações da Via Sacra com devoção numa igreja ou local autorizado também concede indulgência plenária.
  • Rezar o Rosário em Grupo: Rezar o Rosário em grupo numa igreja, capela ou em família concede indulgência plenária.
  • Leitura da Sagrada Escritura: Ler ou ouvir a Sagrada Escritura pelo menos durante meia hora concede indulgência plenária.
  • Bênção Papal: Receber a bênção papal (seja diretamente do Papa ou através dos meios de comunicação) concede indulgência plenária, desde que o fiel cumpra as condições normais.
  • Participação no Ano Jubilar: Durante o Ano Santo (Jubileu), visitar uma igreja designada e realizar um ato de piedade concede indulgência plenária.
  • Confissão Sacramental: No dia em que se faz a primeira confissão sacramental, o fiel pode receber uma indulgência plenária.

Exemplos de Indulgências Parciais:

  • Recitar o Angelus: Rezar o “Angelus” ou o “Regina Coeli” (durante o tempo pascal) concede indulgência parcial.
  • Sinal da Cruz: Fazer o Sinal da Cruz com devoção e fé concede indulgência parcial.
  • Ato de Contrição: Rezar o Ato de Contrição com o coração contrito concede indulgência parcial.
  • Uso de Objetos Religiosos Abençoados: Usar devotamente um crucifixo, rosário ou outro objeto religioso abençoado por um sacerdote concede indulgência parcial.
  • Invocar o Nome de Jesus: Dizer com reverência e fé “Jesus” concede indulgência parcial.
  • Ato de Caridade: Qualquer ato de caridade realizado em nome da fé cristã, como ajudar os necessitados, também pode conceder uma indulgência parcial.

Indulgências Ligadas a Festas Especiais
A Igreja oferece indulgências plenárias em ocasiões específicas, como no Dia de Finados (2 de novembro), quando os fiéis podem visitar um cemitério e rezar pelas almas do Purgatório durante a oitava deste dia.

Quantas indulgências se pode receber?

A Igreja Católica permite que os fiéis recebam uma indulgência plenária por dia. No entanto, para receber uma indulgência plenária, é necessário cumprir as condições exigidas. As indulgências parciais podem ser recebidas várias vezes ao dia, sem limite. Ou seja, para indulgências parciais, não há restrição de quantidade, e elas podem ser adquiridas ao longo do dia através meio de diferentes atos devocionais.

Existem ocasiões especiais, como em perigo iminente de morte, nas quais a Igreja permite que o fiel receba uma indulgência plenária adicional no mesmo dia, mesmo que já tenha recebido outra anteriormente.

O que uma indulgência não é

Existem algumas “noções absurdas” que se tornaram corriqueiras na descrição do que é uma indulgência. Eis erros comuns daquilo que uma indulgência não é:

  • Não é uma permissão para cometer o pecado, nem o perdão do futuro pecado, que nem poderia ser concedida por qualquer poder.
  • Não é o perdão da culpa do pecado, pois supõe que o pecado já foi perdoado.
  • Não é uma isenção de qualquer lei ou dever, pelo contrário, significa um pagamento mais completo da dívida que o pecador deve a Deus. Não confere imunidade contra a tentação ou remove a possibilidade de lapsos subsequentes em pecado.
  • Muito menos uma indulgência é a compra de um perdão que assegura ao comprador a salvação ou liberta a alma de outro do Purgatório.

Conclusão

As indulgências são uma prática profundamente enraizada na tradição católica, com o objetivo de ajudar os fiéis a alcançar a purificação total das almas e aproximá-los de Deus. Embora tenham sido alvo de controvérsia, especialmente durante o período da Reforma Protestante, a Igreja Católica, através do Concílio de Trento, reafirmou a sua importância, ao mesmo tempo que condenou abusos e práticas corruptas a ela associadas.

Hoje, as indulgências permanecem um meio valioso para os católicos renovarem a sua vida espiritual, procurando a conversão verdadeira e a comunhão com Deus, sempre entendendo que elas não são “compradas” ou um substituto para o arrependimento sincero, mas um auxílio espiritual dentro da caminhada de fé.

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