Neste dia, em 1258, a relíquia do dedo de São Tomé era transferida para Roma

Entre as relíquias mais veneradas do cristianismo encontra-se uma de profunda força simbólica e espiritual: o dedo de São Tomé Apóstolo, aquele que tocou as santas chagas de Jesus após a Ressurreição.
Guardada atualmente na Basílica da Santa Cruz de Jerusalém (Santa Croce in Gerusalemme), em Roma, esta relíquia é um testemunho tangível da fé que nasce da dúvida — um sinal da misericórdia de Cristo que permitiu ao apóstolo “ver e crer”.

São Tomé, o Apóstolo da Fé Nascida da Dúvida

São Tomé, também conhecido como Dídimo (“gémeo”, em grego), foi um dos Doze Apóstolos de Jesus.
Segundo o Evangelho de São João (Jo 20, 24-29), Tomé não estava presente quando o Ressuscitado apareceu pela primeira vez aos discípulos. Quando lhe contaram, respondeu com célebre incredulidade:

Se não vir o sinal dos pregos nas suas mãos e não meter o meu dedo no lugar dos pregos e a minha mão no seu lado, não acreditarei.” (Jo 20, 25)

Oito dias depois, Cristo apareceu novamente e dirigiu-se a Tomé, convidando-o a tocar-lhe as feridas. Então o apóstolo exclamou:

Meu Senhor e meu Deus!” (Jo 20, 28)

Este episódio deu origem a uma das mais belas confissões de fé da história cristã, e o dedo de Tomé tornou-se símbolo da proximidade entre fé e experiência, entre dúvida e certeza divina.

As relíquias de São Tomé: de Meliapor a Edessa

Depois da Ascensão do Senhor, segundo a tradição, São Tomé partiu em missão para o Oriente, pregando o Evangelho na Pérsia e sobretudo na Índia, onde teria sofrido martírio.
A tradição mais antiga situa o martírio do apóstolo em Meliapor (atual Chennai, Índia), por volta do ano 72 d.C., onde foi trespassado por uma lança enquanto rezava diante de uma cruz.

Os seus restos mortais foram venerados localmente até que, por volta do ano 230 d.C., parte das suas relíquias — segundo o historiador Edesseu — foram transferidas para Edessa (atual Şanlıurfa, na Turquia), um dos primeiros grandes centros cristãos do Oriente.
Ali, a cidade construiu uma basílica em sua honra, tornando-se destino de peregrinações durante séculos.

De Edessa a Roma: a transladação para o Ocidente

Durante as invasões e disputas territoriais no Oriente Próximo, muitas relíquias foram deslocadas para preservar a sua segurança.
A relíquia do dedo de São Tomé, em particular, foi transferida de Edessa para Roma a 6 de setembro de 1258, quando várias relíquias apostólicas foram levadas para o Ocidente.

O dedo foi então deposto na Basílica da Santa Cruz de Jerusalém (Santa Croce in Gerusalemme), onde permanece até aos nossos dias.

Outras relíquias de São Tomé, incluindo ossos e a pedra do seu túmulo, foram levadas para Ortona, na Itália, onde são veneradas na catedral dedicada ao apóstolo. Elas foram transportadas de Chios, uma ilha grega, por volta do mesmo ano.

A Basílica da Santa Cruz de Jerusalém e a guarda da relíquia

A Basílica da Santa Cruz de Jerusalém é um dos sete santuários principais de Roma e possui uma das mais ricas coleções de relíquias da Paixão de Cristo. Fundada pela imperatriz Santa Helena, mãe de Constantino, por volta do ano 320 d.C., foi construída para guardar as relíquias trazidas da Terra Santa — fragmentos da Verdadeira Cruz, espinhos da coroa, o título “INRI”, e outros tesouros.

Entre essas relíquias, está guardado o dedo de São Tomé, exposto num relicário de cristal e prata, colocado na Capela das Relíquias, à direita do altar principal.
A tradição recorda que o dedo foi colocado aí após uma reorganização das relíquias maiores de Roma.

O Relicário e a veneração pública

O relicário do dedo de São Tomé é uma obra de arte sacra de grande delicadeza, provavelmente datada do século XVIII, embora contenha a relíquia muito mais antiga.
Feito em prata dourada e cristal de rocha, apresenta uma pequena cápsula transparente em que se vê o fragmento do dedo, envolto em seda vermelha e selado com lacre pontifício.
Uma inscrição latina identifica a relíquia: “Digitus Sancti Thomae Apostoli”.

A relíquia é exposta ao público em ocasiões especiais, particularmente no domingo após a Páscoa, conhecido como Domingo da Divina Misericórdia, que recorda o encontro de Cristo Ressuscitado com São Tomé.
Nessas ocasiões, os fiéis podem venerar a relíquia e renovar o ato de fé: “Meu Senhor e meu Deus”.

A última exposição pública solene ocorreu a 7 de abril de 2024, acompanhada de uma missa presidida pelo cardeal arcipreste da basílica, com a participação de peregrinos de vários países.

O significado espiritual da relíquia

Mais do que um vestígio físico, o dedo de São Tomé representa a transformação interior que a fé opera na dúvida humana.
Cristo não condenou o apóstolo pela sua incredulidade, mas permitiu-lhe tocar a ferida gloriosa — símbolo da misericórdia divina que se deixa encontrar e tocar.

Por isso, esta relíquia convida cada cristão a fazer a mesma profissão de fé:
Felizes os que acreditam sem terem visto.” (Jo 20, 29)

A presença da relíquia na Basílica da Santa Cruz de Jerusalém, junto às relíquias da Paixão, reforça este elo profundo: aquele que tocou o Corpo Ressuscitado está agora junto dos sinais da Cruz, lembrando que a fé nasce da experiência do Amor de Deus feito homem.

Curiosidades históricas e devocionais

  • A relíquia é mencionada pela primeira vez em catálogos de relíquias romanos do século VIII, sob o título “Digitus sancti Thomae, in basilica sanctae Crucis”.
  • No ano de 1584, o Papa Gregório XIII ordenou uma nova catalogação das relíquias da basílica, confirmando a autenticidade do dedo de São Tomé.
  • Durante a ocupação napoleónica (1798), as relíquias foram temporariamente escondidas pelos monges cistercienses que guardavam a basílica, sendo novamente expostas em 1815, após a restauração papal.
  • Desde 1983, a relíquia é venerada anualmente na Festa de São Tomé Apóstolo, celebrada a 3 de julho, segundo o calendário litúrgico romano.

Conclusão

A reliquia do dedo de São Tomé é um dos mais comoventes testemunhos da fé cristã, preservada com amor e devoção ao longo dos séculos.
Do Oriente à Cidade Eterna, atravessou impérios, guerras e gerações, permanecendo como sinal de que a fé não é ausência de dúvida, mas encontro transformador com o Ressuscitado.

Ao contemplar esta relíquia, cada cristão é convidado a renovar a sua profissão de fé com as mesmas palavras do apóstolo:
Meu Senhor e meu Deus!

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