O Concílio de Éfeso, realizado em 431, marcou um dos momentos mais decisivos da história da Igreja, ao proclamar solenemente Maria como Theotókos, termo grego que significa “Mãe de Deus”. Esta definição dogmática não foi apenas uma afirmação sobre a Virgem Maria, mas sobretudo uma defesa da verdadeira identidade de Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem.
Contexto histórico e teológico
No início do século V, a Igreja enfrentava intensas controvérsias cristológicas — debates sobre quem era Jesus Cristo e como se relacionavam as suas naturezas divina e humana.
Um dos protagonistas desta crise foi Nestório, patriarca de Constantinopla, que começou a ensinar que Maria não devia ser chamada Theotókos (“Mãe de Deus”), mas apenas Christotókos (“Mãe de Cristo”).
Segundo Nestório, Maria teria dado à luz apenas o homem Jesus, e não o Verbo divino, que ele considerava unido a Jesus apenas por uma relação moral ou de cooperação. Esta doutrina, no entanto, punha em causa a própria união hipostática — a verdade de que em Cristo há uma só pessoa, divina, com duas naturezas: humana e divina.
A convocação do Concílio
O Papa Celestino I reagiu com firmeza, condenando os ensinamentos de Nestório. A pedido do imperador Teodósio II, foi convocado um Concílio Ecuménico na cidade de Éfeso, na Ásia Menor (atual Turquia), com o objetivo de resolver a controvérsia.
O Concílio teve início a 22 de junho de 431, sob a presidência de São Cirilo de Alexandria, representante do Papa.
As deliberações e a proclamação de Maria como Theotókos
Logo na primeira sessão, antes mesmo da chegada de alguns bispos orientais simpatizantes de Nestório, o Concílio analisou as cartas de Cirilo e as posições de Nestório.
A assembleia reconheceu como verdadeira fé católica a doutrina de que:
“O Verbo, ao unir a si uma carne animada por uma alma racional, fez-se homem de modo inefável e inexplicável, e assim, Maria é Theotókos, pois deu à luz, segundo a carne, o Verbo de Deus feito carne.”
Nestório foi condenado como herege e deposto do seu cargo episcopal. A Igreja universal, em comunhão com Roma e Alexandria, proclamou solenemente que Maria é verdadeiramente Mãe de Deus, porque o filho que concebeu e deu à luz é o Filho eterno de Deus, consubstancial ao Pai.
Significado teológico do dogma
A definição do Concílio de Éfeso tem um duplo alcance: cristológico e mariano.
- Cristológico
O título de Theotókos salvaguarda a verdade de que Jesus Cristo é uma só pessoa, não duas, uma divina e outra humana separadas. Aquele que nasceu de Maria é o mesmo que existia desde toda a eternidade junto do Pai. - Mariano
Ao reconhecer Maria como Theotókos, a Igreja reconhece o papel singular de Maria na história da salvação. Ela não é apenas mãe de um homem extraordinário, mas de Deus feito homem e, por isso, participa intimamente no mistério da Encarnação.
Repercussões na Igreja e na piedade popular
A proclamação de Maria como Theotókos teve um impacto profundo na teologia, na liturgia e na devoção dos fiéis.
- Teologicamente, reforçou a doutrina da Encarnação e preparou o caminho para os desenvolvimentos posteriores nos concílios de Calcedónia (451) e Constantinopla II (553).
- Liturgicamente, difundiu-se rapidamente a festa de Santa Maria, Mãe de Deus, celebrada atualmente a 1 de janeiro no calendário litúrgico da Igreja.
- Na devoção popular, o título Mãe de Deus tornou-se uma das expressões mais amadas e invocadas pelos cristãos. As orações antigas, como o Sub tuum praesidium (“À vossa proteção recorremos, Santa Mãe de Deus”), testemunham a fé da Igreja neste título desde os primeiros séculos.
Conclusão
O Concílio de Éfeso (431) e a proclamação de Maria como Theotókos constituem um marco fundamental na história do cristianismo. O dogma da Maternidade Divina de Maria protege a verdade essencial da fé: em Jesus Cristo, Deus fez-se realmente homem.
Ao chamar Maria Mãe de Deus, a Igreja não exagera o papel da Virgem, mas confessa o mistério da Encarnação, fonte de toda a esperança cristã.
Como afirmou São Cirilo de Alexandria no próprio Concílio: “Se alguém não confessa que Emmanuel é verdadeiramente Deus, e por isso a Santíssima Virgem é Theotókos, porque deu à luz segundo a carne o Verbo de Deus feito carne, seja anátema.”
Assim, desde Éfeso até hoje, a Igreja continua a aclamar Maria com o mesmo título que os fiéis entoaram nas ruas daquela cidade em 431:
“Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós!”