O Édito de Tessalónica, proclamado a 27 de fevereiro de 380 d.C. pelo imperador Teodósio I, juntamente com os coimperadores Graciano e Valentiniano II, foi um dos documentos mais importantes da história da Igreja e da civilização ocidental. Através dele, o cristianismo, na sua forma nicena (ou seja, de acordo com a fé definida no Concílio de Niceia em 325), deixou de ser apenas uma religião tolerada ou privilegiada, passando a ser a religião oficial do Império Romano.
Para compreender a importância deste édito, é necessário situá-lo no contexto histórico e religioso anterior.
O contexto antes do Édito de Tessalónica
1. Perseguições e martírio dos cristãos
Nos três primeiros séculos do cristianismo, os seguidores de Cristo viveram sob constantes perseguições, que variavam em intensidade consoante o imperador romano. A fé cristã era considerada perigosa porque se opunha ao culto aos deuses romanos e ao imperador.
- Entre os momentos mais severos, destacam-se as perseguições sob Nero (64 d.C.), Décio (249-251) e Diocleciano (303-311).
- Milhares de cristãos foram mortos, incluindo mártires célebres como São Pedro, São Paulo, Santa Inês e Santa Cecília.
2. O Édito de Milão (313)
Um grande ponto de viragem ocorreu quando o imperador Constantino publicou o Édito de Milão, em 313, juntamente com Licínio. Esse decreto concedia liberdade de culto em todo o Império Romano e restituía aos cristãos os bens confiscados durante as perseguições. O cristianismo deixou de ser ilegal e começou a expandir-se rapidamente.
Constantino favoreceu a Igreja, mandando construir basílicas (como a de São Pedro, em Roma) e convocando o Concílio de Niceia (325), que condenou a heresia do arianismo e afirmou a divindade de Cristo.
3. As disputas internas do cristianismo
Apesar do crescimento, o cristianismo estava dividido por heresias e correntes divergentes, em particular o arianismo, que negava a plena divindade de Jesus Cristo. Muitos imperadores, como Constâncio II, chegaram a favorecer os arianos, provocando divisões na Igreja.
Quando Teodósio subiu ao trono do Oriente em 379, o cristianismo encontrava-se em expansão, mas ainda sem unidade plena e sem estatuto oficial.
O Édito de Tessalónica (380)
A 27 de fevereiro de 380, em Tessalónica, o imperador Teodósio I promulgou o decreto conhecido como Cunctos Populos ou De Fide Catolica.
O texto estabelecia:
- Todos os povos sujeitos ao Império Romano deviam professar a fé que o apóstolo Pedro teria transmitido aos romanos e que era seguida pelo bispo de Roma (o Papa) e pelo bispo de Alexandria.
- A fé oficial era a dos cristãos nicenos, isto é, que acreditavam na Santíssima Trindade: Pai, Filho e Espírito Santo, iguais em dignidade e poder.
- Os que não aceitassem esta fé seriam considerados hereges e sujeitos a sanções civis.
O impacto do Édito de Tessalónica
1. O cristianismo torna-se religião oficial
O édito transformou o cristianismo de religião tolerada em religião oficial do Estado. Assim, todos os cargos e estruturas do Império passaram a favorecer diretamente a fé cristã.
2. O fim definitivo do paganismo
A partir do édito, os cultos pagãos foram sendo cada vez mais reprimidos. Em 391, Teodósio proibiu oficialmente os sacrifícios pagãos e fechou templos. As antigas religiões desapareceram gradualmente ou foram absorvidas em costumes populares.
3. Unidade religiosa e política
O édito procurava também consolidar a unidade política do Império. Teodósio acreditava que a divisão religiosa enfraquecia a estabilidade imperial, e por isso impôs a fé nicena como laço comum.
4. Consequências para a Igreja
A Igreja, até então perseguida e depois apenas tolerada, tornou-se instituição central da vida pública e cultural:
- Os bispos ganharam grande influência nas decisões políticas.
- O Papa de Roma consolidou a sua primazia espiritual.
- O cristianismo passou a moldar as leis, a cultura, a moral e a visão do mundo no Ocidente.
Conclusão
O Édito de Tessalónica (380) marcou o momento em que o cristianismo deixou de ser apenas uma religião em crescimento para se tornar a religião oficial do Império Romano. Após séculos de perseguição e divisões internas, a fé nicena passou a ser o pilar espiritual e político da civilização romana.
O impacto foi duradouro: este édito lançou as bases da Cristandade medieval, deu força à Igreja como guia espiritual e cultural da Europa, e consolidou a imagem do cristianismo como religião universal, destinada a unir povos e culturas sob a mesma fé.