São João Nepomuceno nasceu por volta de 1345 em Nepomuk, na Boémia (atual República Checa). Desde cedo revelou vocação religiosa, estudando teologia e direito canónico em Praga e mais tarde em Pádua, Itália. Ordenado sacerdote, destacou-se como pregador e como homem de profunda vida espiritual.
Era conhecido pelo zelo pastoral, pela humildade e pela fidelidade absoluta à Igreja. Foi nomeado cónego da Catedral de São Vito, em Praga, e acabou por se tornar vigário-geral da arquidiocese de Praga, servindo sob o arcebispo João de Jenštejn.
O conflito com o rei Venceslau IV
O contexto político e religioso do reino da Boémia era tenso. O rei Venceslau IV, filho do imperador Carlos IV, mantinha uma relação difícil com a Igreja. João Nepomuceno tornou-se uma figura central neste conflito, porque defendia com firmeza a autonomia e os direitos da Igreja perante as ingerências reais.
Segundo a tradição, o ponto de maior atrito deu-se ao sigilo da confissão. João Nepomuceno era confessor da rainha Sofia, esposa de Venceslau IV. O rei, suspeitando da fidelidade da esposa, terá exigido ao sacerdote que revelasse aquilo que a rainha lhe confessava. João recusou-se terminantemente, invocando a inviolabilidade do sacramento da penitência.
Martírio
Na noite de 20 de março de 1393, João Nepomuceno foi preso por ordem do rei. Após interrogatórios e torturas, foi levado até à ponte Carlos, em Praga, e atirado ao rio Moldava, onde morreu afogado.
Este ato foi entendido pelo povo como um verdadeiro martírio em defesa da fé e, em particular, do sigilo sacramental da confissão. Pouco tempo depois, o povo de Praga começou a venerá-lo como mártir e intercessor.
Exumação e a descoberta da língua incorrupta
Mais de 300 anos após a sua morte, a 27 de janeiro de 1725, um professor de medicina e dois cirurgiões exumaram os restos mortais do mártir na presença de uma comissão de autoridades eclesiásticas. O que se encontrou deixou marca profunda na história da Igreja.
O corpo já estava reduzido a ossos e pó, como seria natural, mas a língua do santo estava aparentemente intacta. Os testemunhos da época relatam que, ao ser exposta, a língua parecia ter uma cor avermelhada e um aspeto fresco, como se fosse viva.
Em 1973, análises científicas confirmaram que o tecido preservado no relicário correspondia, de facto, a uma parte da língua e do tecido mole da laringe. Embora não estivesse totalmente incorrupta, a língua apresentava sinais notáveis de preservação incomum para a época e as condições.
Este fenómeno foi interpretado pela Igreja como um sinal divino, testemunhando a fidelidade de João Nepomuceno ao sigilo da confissão.
Canonização e culto
João Nepomuceno foi beatificado em 1721 pelo Papa Inocêncio XIII. Em 1729, o Papa Bento XIII proclamou-o santo. O seu culto espalhou-se rapidamente pela Europa Central e depois por todo o mundo católico.
Hoje, São João Nepomuceno é venerado como:
- Padroeiro dos confessores, pelo seu martírio em defesa do sacramento da penitência.
- Protetor contra calúnias e falsos testemunhos.
- Protetor das pontes e viajantes sobre as águas, pelo modo como foi martirizado.
Iconografia e legado
São João Nepomuceno é facilmente reconhecido na arte sacra:
- Veste batina e sobrepeliz de cónego, muitas vezes com a capa pluvial.
- Segura uma cruz junto ao peito, sinal da sua entrega a Cristo.
- Ao seu redor surgem frequentemente cinco estrelas, símbolo da tradição que afirma que, quando o seu corpo caiu no rio Moldava, cinco estrelas apareceram sobre as águas.
A sua figura permanece como um forte símbolo da fidelidade sacerdotal e da defesa intransigente do sigilo da confissão, que até hoje a Igreja considera absoluto e inviolável.
Conclusão
São João Nepomuceno deixou à Igreja não apenas o testemunho de um homem fiel até ao martírio, mas também um sinal tangível da graça divina, através da sua língua incorrupta. O facto de a parte do corpo associada à palavra e à confissão se ter preservado foi entendido como uma confirmação visível do valor da fidelidade sacerdotal.
A sua vida, morte e culto fazem dele um dos santos mais importantes da Europa Central e um padroeiro universal dos confessores, lembrando a cada sacerdote a grandeza e a responsabilidade do sacramento da penitência.