Neste dia, em 1586, era erguido na Praça de São Pedro o Obelisco do Vaticano

O Obelisco do Vaticano, erguido no centro da Praça de São Pedro, é uma das mais impressionantes e antigas estruturas da Cidade do Vaticano.
Mais do que um simples monumento, é um símbolo da continuidade entre o mundo antigo e o cristianismo, uma testemunha de dois milénios de história, fé e civilização.

Origem no Egito Antigo

O obelisco tem uma origem muito anterior ao cristianismo.
Foi construído no Egito Antigo, provavelmente na cidade de Heliópolis, durante o reinado do faraó Amenemés II (c. 1971–1926 a.C.) ou, segundo alguns estudiosos, do faraó Nencó II (século VI a.C.).
Feito de granito vermelho de Assuão, o monólito tem 25,5 metros de altura (ou cerca de 40 metros com a base e a cruz atuais) e pesa aproximadamente 326 toneladas.

O obelisco era originalmente um monumento pagão dedicado ao Sol, símbolo de poder e eternidade.
No Egito, os obeliscos eram considerados raios petrificados do deus Rá, representando a ligação entre o céu e a terra.

Chegada a Roma: símbolo imperial

O imperador Caio Calígula mandou transportar o obelisco de Heliópolis para Roma em 37 d.C., para ornamentar o Circo de Calígula e Nero, localizado na colina do Vaticano, numa área então fora dos muros da cidade.
A operação foi uma proeza técnica notável: o obelisco viajou por mar em um navio especialmente construído para o transportar, com uma barca de reforço que depois seria usada para levar grãos do Egito para Roma.

O obelisco foi erguido no espinhaço central do circo (o eixo da arena), onde servia como ponto de referência para as corridas de carros.
Durante este período, o monumento era um símbolo de poder imperial e dominação sobre o Egito, então província romana.

Testemunha dos primeiros mártires cristãos

Foi neste mesmo Circo de Nero que, segundo a tradição, muitos cristãos foram martirizados durante as perseguições imperiais.
Entre eles, destaca-se São Pedro, o primeiro Papa, que terá sido crucificado nas proximidades, com a cabeça voltada para baixo, por volta do ano 64 d.C.

Assim, o obelisco — outrora símbolo pagão — tornou-se testemunha silenciosa do sangue dos mártires e, mais tarde, símbolo da vitória do cristianismo sobre o paganismo.

A transferência para a Praça de São Pedro

Durante mais de 1.500 anos, o obelisco permaneceu no mesmo local, junto às ruínas do antigo circo.
Mas no século XVI, o Papa Sisto V (Felice Peretti) decidiu transferi-lo para o centro da nova Praça de São Pedro, como parte de uma ambiciosa reorganização urbanística do Vaticano.

A tarefa monumental foi confiada ao engenheiro Domenico Fontana, um dos maiores mestres de engenharia do Renascimento.
O trabalho começou em 30 de abril de 1586 e exigiu 900 homens, 140 cavalos e 44 guindastes.
O obelisco foi finalmente erguido no novo local em 10 de setembro de 1586, após meses de esforço e precisão — sem que se partisse o monólito nem se perdesse o equilíbrio durante a manobra.

Uma história de fé e disciplina

Durante a operação de transporte, o Papa Sisto V ordenou silêncio absoluto sob pena de morte, para evitar distrações que pudessem causar desastre.
Segundo a tradição, quando o obelisco começou a inclinar-se perigosamente, um marinheiro genovês chamado Benedetto Bresca gritou: “Água às cordas!” (Aqua alle funi!)

O conselho salvou a operação, e em recompensa o Papa concedeu ao marinheiro e à sua família o direito de fornecer as palmas da procissão de Domingo de Ramos à Basílica de São Pedro — um privilégio que ainda hoje se mantém.

A cruz cristã no topo

Uma vez erguido, Sisto V ordenou a consagração cristã do obelisco, transformando o antigo símbolo solar pagão num emblema da fé em Cristo.
Foi colocada uma cruz no topo, substituindo a esfera de bronze que o coroava desde os tempos de Calígula.
A cruz contém, segundo a tradição, um fragmento da Santa Cruz de Cristo, enviado de Jerusalém.

Na base, mandou gravar as palavras em latim: “Ecce Crux Domini! Fugite partes adversae!”
(“Eis a Cruz do Senhor! Fugi, forças inimigas!”)

Com este gesto, o Papa quis afirmar que o poder de Cristo triunfava sobre os antigos deuses e impérios.

O obelisco e a Praça de São Pedro

O Obelisco Vaticano tornou-se o centro geométrico e simbólico da Praça de São Pedro, desenhada mais tarde por Gian Lorenzo Bernini no século XVII.
As duas colunatas que abraçam a praça foram projetadas para convergir visualmente para o obelisco, representando os “braços da Igreja que acolhem os fiéis”.

A estrutura funciona também como um relógio solar gigante: as sombras projetadas pelo obelisco marcam as horas e indicam os equinócios, graças a marcas no chão que foram adicionadas em 1817 por monsenhor Francesco Bianchini.

Dimensões e características

  • Altura original: 25,5 metros
  • Altura total com base e cruz: 40 metros
  • Peso estimado: 326 toneladas
  • Material: granito vermelho de Assuão
  • Localização atual: centro da Praça de São Pedro
  • Ano da transladação: 1586
  • Engenheiro responsável: Domenico Fontana

Significado espiritual

O obelisco do Vaticano é muito mais do que uma peça arqueológica.
É um símbolo de transformação — de pedra pagã a monumento cristão.
Representa a vitória da fé sobre o império, a memória dos mártires e a universalidade da Igreja.

No centro da praça onde milhões de peregrinos se reúnem para ver o Papa, o obelisco ergue-se como um eixo do mundo, apontando para o céu e recordando que a história humana, por mais antiga ou gloriosa, encontra o seu verdadeiro sentido em Deus.

Curiosidades e legado

  • É o único obelisco de Roma que nunca caiu desde a Antiguidade.
  • É também o único obelisco romano sem inscrições hieroglíficas, o que o torna singular entre os de origem egípcia.
  • No topo, sob a cruz, existe uma pequena reliquia da Vera Cruz, colocada por ordem de Sisto V.
  • O obelisco é abençoado pelo Papa todos os anos na solenidade da Páscoa e em várias cerimónias litúrgicas.
  • É um dos 13 obeliscos egípcios ainda existentes em Roma, mas o mais conhecido e venerado.

Conclusão

O Obelisco do Vaticano é, sem dúvida, um dos monumentos mais emblemáticos do cristianismo e da história universal.
Erguido originalmente como homenagem ao deus Sol, foi consagrado ao Cristo Ressuscitado, tornando-se o símbolo vertical da fé que atravessa os séculos.

De testemunha do martírio de São Pedro a ponto central da basílica que leva o seu nome, o obelisco continua a recordar, silenciosamente, a união entre a eternidade divina e o tempo humano — entre o Egito dos faraós e o coração do catolicismo.

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