A devoção a Nossa Senhora de Ta’ Pinu é um dos maiores tesouros espirituais de Malta, especialmente da ilha de Gozo, onde o santuário que lhe é dedicado se ergue entre colinas, com vista sobre o mar Mediterrâneo. Conhecida como a “Mãe de Malta”, a Virgem de Ta’ Pinu está associada a uma história de milagre e fé profunda, que transformou um pequeno oratório rural num dos mais importantes centros de peregrinação do mundo católico.
Origens do Santuário
O nome Ta’ Pinu (“de Filipe”) vem de Pinu Gauci, um habitante local que, no século XVI, restaurou uma pequena capela rural dedicada originalmente à Assunção de Nossa Senhora.
A primeira referência documental à capela data de 1598, quando o bispo de Gozo, durante uma visita pastoral, mencionou a sua existência. Apesar da simplicidade da construção, o local tornou-se um ponto de oração silenciosa e devoção popular.
Em 1611, Pinu Gauci assumiu a responsabilidade de restaurar o templo, financiando obras e incentivando a prática da oração. O seu nome acabou por ficar associado à capela, que passou a ser conhecida como “Ta’ Pinu”, isto é, “a de Pinu”.
Durante o século XVII, o pequeno oratório foi alvo de melhorias e recebeu uma pintura que se tornaria central em toda a história: o ícone da Virgem Maria, obra do artista Amadeo Perugino, concluída em 1619. Esta imagem, representando Nossa Senhora com o Menino Jesus, foi colocada sobre o altar e permaneceu no local mesmo quando outras capelas da região foram demolidas, por ordem eclesiástica, em meados do século XIX.
O Milagre de 1883
A devoção a Nossa Senhora de Ta’ Pinu ganhou verdadeira projeção em 22 de junho de 1883, data do milagre que marcou para sempre a história do santuário.
Nesse dia, uma camponesa local, Karmni Grima, de 45 anos, ao passar junto à pequena capela, ouviu claramente uma voz feminina chamá-la:
“Vem cá, vem cá, porque há muito tempo que te espero.”
Assustada, Karmni entrou na capela e, ajoelhando-se diante da imagem de Nossa Senhora, ouviu novamente a voz, que lhe pediu para rezar três Ave-Marias em honra dos três dias que o corpo de Nossa Senhora permaneceu no sepulcro antes da Assunção.
Temendo ser vítima de ilusão, Karmni manteve o episódio em segredo até partilhá-lo com o seu amigo Frangisk Portelli, um homem piedoso de aldeia próxima, que confessou ter também ouvido uma voz a pedir-lhe que rezasse pelas chagas de Cristo. Pouco depois, a mãe de Frangisk foi curada milagrosamente de uma doença incurável.
Esses acontecimentos foram rapidamente reconhecidos pelos fiéis como sinais da intervenção da Virgem Maria, e a notícia espalhou-se por toda Malta, levando multidões a visitar o pequeno oratório.
Expansão da Devoção e Construção da Basílica
Com o aumento das peregrinações, tornou-se evidente que a antiga capela era demasiado pequena para acolher tantos devotos. Assim, em 1920, o bispo de Gozo iniciou a construção de uma nova basílica, em estilo românico, para honrar Nossa Senhora de Ta’ Pinu.
A obra foi concluída em 1931, preservando a antiga capela intacta — hoje incorporada na estrutura da basílica, à esquerda do altar-mor.
A igreja, construída com a típica pedra dourada de Gozo, é notável pela sua elegância simples e profunda espiritualidade, estando rodeada de um vasto santuário com ex-votos, pinturas e objetos deixados por fiéis gratos por graças recebidas.
Em 1935, o Papa Pio XI concedeu indulgências especiais aos peregrinos que visitassem o santuário, e em 1936, Ta’ Pinu foi oficialmente proclamada santuário nacional de Malta.
Visitas Papais
O santuário de Nossa Senhora de Ta’ Pinu tornou-se também um lugar de peregrinação papal, símbolo do carinho da Igreja pelos malteses.
- João Paulo II visitou Ta’ Pinu em 26 de maio de 1990, durante a sua viagem apostólica a Malta. O Papa rezou diante da imagem milagrosa e deixou uma coroa de ouro como sinal de devoção, consagrando o país à proteção da Virgem.
No final da celebração, declarou: “Maria, Mãe de Ta’ Pinu, olhai por este povo fiel, guardai as suas famílias e protegei a fé que floresceu nesta ilha desde os tempos apostólicos.” - Bento XVI visitou Malta em abril de 2010, evocando a devoção a Nossa Senhora de Ta’ Pinu e encorajando os malteses a manterem viva a tradição de fé mariana. Embora não tenha visitado Gozo pessoalmente, enviou uma bênção especial ao santuário.
- Papa Francisco fez uma visita histórica a Ta’ Pinu a 2 de abril de 2022, durante a sua viagem apostólica a Malta. Rezou em silêncio diante da imagem da Virgem, confiando-lhe o povo maltês e o mundo inteiro, especialmente as vítimas de guerra e de sofrimento. No seu discurso, recordou que a fé simples de Karmni Grima é “um exemplo luminoso de escuta e confiança em Deus”.
O Ícone e os Milagres
O ícone original de Nossa Senhora de Ta’ Pinu é preservado com grande veneração na basílica. A pintura, de estilo renascentista, retrata a Virgem segurando o Menino Jesus e apontando-o como fonte de salvação.
Ao longo dos anos, centenas de curas, conversões e graças foram atribuídas à intercessão da Virgem de Ta’ Pinu. O santuário conserva milhares de ex-votos, fotografias, muletas, medalhas e objetos pessoais, que testemunham a fé e a gratidão dos devotos.
Cópias do ícone foram enviadas para diversas partes do mundo, incluindo Austrália, Canadá, Estados Unidos e Itália, acompanhando as comunidades maltesas emigrantes e mantendo viva a devoção além-mar.
Situação Atual
Hoje, o Santuário de Nossa Senhora de Ta’ Pinu é um dos principais locais de peregrinação do Mediterrâneo. O espaço é administrado pela Diocese de Gozo e acolhe anualmente milhares de peregrinos de Malta e de todo o mundo.
Nas imediações da basílica foi criado o Caminho do Rosário, com esculturas monumentais representando os mistérios da fé, e o Caminho da Via Crucis, que conduz até uma cruz no alto da colina, oferecendo uma vista deslumbrante sobre o santuário e o mar.
O local é também palco de celebrações nacionais, como o Dia de Nossa Senhora de Ta’ Pinu (15 de junho), em que os fiéis expressam o seu amor e gratidão à Mãe de Deus, que ali se manifestou através de um simples chamado à oração.
Conclusão
A história de Nossa Senhora de Ta’ Pinu é uma história de escuta, fé e milagres. De uma humilde capela rural nasceu um santuário que hoje une gerações de fiéis e recorda ao mundo o poder da oração e da confiança em Maria.
A voz que um dia chamou Karmni Grima ecoa ainda hoje no coração de todos os peregrinos que sobem ao santuário de Gozo: “Vem cá, vem cá, porque há muito tempo que te espero.”