A expressão “Filho do Homem” é uma das mais usadas por Jesus para referir-se a si próprio nos Evangelhos, e aparece mais de 80 vezes no Novo Testamento. Ao longo dos séculos, estudiosos e teólogos têm-se debruçado sobre o seu significado profundo e as implicações desta escolha de linguagem. Aparentemente simples, a designação de “Filho do Homem” contém uma riqueza teológica, histórica e escatológica que reflete a identidade única de Jesus como o Messias, o Salvador da humanidade.
O contexto bíblico do título “Filho do Homem”
A expressão “Filho do Homem” tem raízes no Antigo Testamento, particularmente no livro de Daniel. No capítulo 7, o profeta Daniel tem uma visão onde descreve “um como o Filho do Homem” que vem sobre as nuvens e recebe de Deus poder e autoridade para governar sobre toda a humanidade:
“Eu estava olhando nas visões da noite, e eis que vinha com as nuvens do céu um como o Filho do Homem; dirigiu-se ao Ancião de Dias, e o fizeram chegar até ele. Foi-lhe dado domínio, e honra, e o reino, para que todos os povos, nações e línguas o servissem” (Daniel 7:13-14).
Neste contexto, o “Filho do Homem” é uma figura celestial que tem uma ligação especial com Deus e que recebe autoridade divina. Assim, ao usar essa expressão, Jesus estava a fazer uma ligação implícita à visão de Daniel, sugerindo a sua identidade messiânica e papel escatológico como aquele que traria a justiça e a salvação.
Jesus e o “Filho do Homem”: Um título de humildade e exaltação
Ao mesmo tempo que “Filho do Homem” evoca uma imagem celestial e gloriosa, também pode ser entendido como um termo de humildade. Na literatura bíblica, “filho do homem” pode simplesmente significar um ser humano, ou “filho de Adão”. Em livros como Ezequiel, por exemplo, o profeta é chamado frequentemente de “filho do homem”, num sentido que sublinha a sua natureza humana e a sua posição em relação à grandeza de Deus.
Jesus, ao referir-se a si mesmo como “Filho do Homem”, estava a enfatizar a sua identificação com a humanidade. Embora ele fosse verdadeiramente o Filho de Deus, veio ao mundo como um homem, assumindo a nossa natureza, partilhando as nossas fragilidades e sofrendo as nossas dores. Assim, “Filho do Homem” encapsula tanto a sua humildade, enquanto ser humano, como a futura exaltação, enquanto figura escatológica.
O título e a missão redentora de Jesus
Ao longo dos Evangelhos, Jesus usa a expressão “Filho do Homem” em diferentes contextos, muitos dos quais estão ligados diretamente à missão de redenção. Ele fala de si mesmo como o “Filho do Homem” que “veio para servir e dar a sua vida como resgate por muitos” (Marcos 10:45). Este uso destaca que a sua vinda ao mundo não foi para ser servido, mas para servir e sacrificar-se pela salvação da humanidade.
Além disso, Jesus associa o “Filho do Homem” com o sofrimento e a paixão. Em várias passagens, Ele prediz que o Filho do Homem será entregue, maltratado e crucificado, e que ao terceiro dia ressuscitará (Mateus 16:21, 17:22-23). Isso enfatiza o papel de Jesus como o Messias sofredor, cuja missão envolve a redenção através do sofrimento e da morte. Assim, o título “Filho do Homem” reflete tanto o seu destino de sofrimento como a promessa da futura vitória sobre a morte.
A escatologia e o “Filho do Homem”
Outro aspecto importante da expressão “Filho do Homem” é a conotação escatológica. Jesus não apenas utilizava o título para falar da sua missão na Terra, mas também para referir-se ao seu regresso futuro em glória. Ele fala do “Filho do Homem” que virá nas nuvens com poder e glória, um claro eco da visão de Daniel:
“E verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu, com poder e grande glória” (Mateus 24:30).
Este uso escatológico aponta para a segunda vinda de Cristo, quando Ele virá como juiz do mundo e consumará o Reino de Deus. Assim, o título “Filho do Homem” abrange tanto a primeira vinda de Jesus, na sua humildade e sofrimento, como a sua segunda vinda, na sua glória e poder.
O mistério da dualidade: Humano e Divino
O título “Filho do Homem” encapsula, de maneira singular, a dupla natureza de Cristo. Ao referir-se a si mesmo como “Filho do Homem”, Jesus revela a sua total identificação com a humanidade. Ele é verdadeiramente um de nós, partilhando das nossas experiências, sofrimentos e limitações. No entanto, ao mesmo tempo, Ele aponta para o seu papel divino e messiânico, como aquele que tem autoridade celestial e que trará o Reino de Deus à plenitude.
Este mistério da dupla natureza de Cristo – ser ao mesmo tempo verdadeiro Deus e verdadeiro homem – está no coração do cristianismo. Ao escolher “Filho do Homem” como o título preferido, Jesus sublinha essa realidade profunda e abre o caminho para os seus seguidores compreenderem tanto a sua missão redentora como a sua natureza divina.
Conclusão
A escolha de Jesus em referir-se tantas vezes como “Filho do Homem” está longe de ser um detalhe irrelevante. Este título carrega uma profundidade teológica que reflete a sua identificação com a humanidade, a missão de redenção e a sua autoridade messiânica e escatológica. Ao usar esta expressão, Jesus revelou não apenas a sua natureza humana, mas também a sua glória divina, e apontou para o futuro retorno, quando Ele trará a plenitude do Reino de Deus. O “Filho do Homem” é, assim, um título que encapsula a grandeza e o mistério de Cristo, que é simultaneamente o servo sofredor e o Rei glorioso.