Neste dia, em 2007, o Papa Bento XVI autorizava a publicação do Documento de Aparecida

O Documento de Aparecida é um dos textos mais importantes do magistério contemporâneo da Igreja Católica na América Latina e no Caribe. Fruto da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe, realizada em 2007 no Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida, no Brasil, o documento tornou-se um marco na renovação missionária da Igreja e influenciou profundamente a reflexão e a ação pastoral do continente.

Mais do que um simples relatório episcopal, o Documento de Aparecida é um verdadeiro programa de evangelização, que procura responder aos desafios do nosso tempo à luz do Evangelho, convidando todos os cristãos a tornarem-se discípulos missionários de Jesus Cristo.

Contexto Histórico e Origens

A V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe foi convocada pelo Papa Bento XVI e organizada pelo Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM).

A conferência decorreu entre 13 e 31 de maio de 2007, na cidade de Aparecida (São Paulo, Brasil), junto ao maior santuário mariano do país.

Antes de Aparecida, o CELAM já havia promovido quatro grandes conferências continentais:

  • Rio de Janeiro (1955) — a primeira reunião de bispos latino-americanos.
  • Medellín (1968) — que aplicou as conclusões do Concílio Vaticano II à realidade latino-americana.
  • Puebla (1979) — que destacou a opção preferencial pelos pobres.
  • Santo Domingo (1992) — centrada na nova evangelização e na cultura.

A quinta conferência, em Aparecida, surgiu num contexto de profunda mudança cultural e social, com o avanço da globalização, o crescimento das seitas e novas formas de secularização.

O Papa Bento XVI escolheu Aparecida para sublinhar a importância de Maria como modelo de fé e discípula missionária, confiando à sua proteção o futuro da Igreja no continente.

O Objectivo da Conferência e do Documento

O principal objetivo da Conferência de Aparecida foi renovar a missão evangelizadora da Igreja na América Latina, redescobrindo a alegria de seguir Cristo e de anunciar o Evangelho.

O tema oficial foi:

“Discípulos e missionários de Jesus Cristo, para que n’Ele os nossos povos tenham vida — ‘Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida’ (Jo 14,6).”

O Documento de Aparecida nasceu deste encontro e tem como propósito inspirar a ação pastoral da Igreja num continente marcado por profundas desigualdades sociais, novos desafios culturais e uma fé muitas vezes superficial.

Ele convida todos os baptizados a uma conversão pessoal e pastoral, e a um novo ardor missionário, para que a Igreja seja “em saída”, como mais tarde diria o Papa Francisco.

Quem Escreveu o Documento

A redação final do Documento de Aparecida foi coordenada por uma comissão de bispos sob a presidência do então cardeal arcebispo de Buenos Aires, Jorge Mario Bergoglio, futuro Papa Francisco.

O texto final foi elaborado com base nas discussões e propostas apresentadas pelos 165 bispos participantes e 28 delegados convidados. Após a revisão e aprovação dos bispos, o texto foi submetido ao Papa Bento XVI, que aprovou a sua publicação em 29 de junho de 2007, solenidade de São Pedro e São Paulo.

A redação de Bergoglio imprimiu ao documento um tom pastoral e missionário muito característico, que mais tarde se refletiria na sua própria encíclica Evangelii Gaudium (2013), considerada uma continuação espiritual de Aparecida.

Estrutura e Conteúdo

O Documento de Aparecida é composto por 554 números divididos em dez capítulos, antecedidos de uma introdução e seguidos de uma conclusão.

  1. Introdução — apresenta o contexto da conferência e o sentido da missão.
  2. Olhar dos Discípulos Missionários sobre a Realidade — análise dos desafios sociais, culturais e religiosos da América Latina e do Caribe.
  3. A Alegria de Ser Discípulo Missionário — reflexão sobre o encontro pessoal com Cristo e a vida em comunidade.
  4. A Vocação dos Discípulos Missionários à Santidade — chamada à conversão e à santidade no quotidiano.
  5. A Comunhão dos Discípulos Missionários na Igreja — importância da vida comunitária e da Eucaristia.
  6. O Caminho de Formação dos Discípulos Missionários — formação integral do cristão para o serviço e a missão.
  7. A Missão dos Discípulos Missionários — anúncio do Evangelho e compromisso social.
  8. O Reino de Deus e a Promoção da Dignidade Humana — defesa da vida, da justiça e dos direitos humanos.
  9. Família, Pessoas e Sociedade — desafios contemporâneos à luz da doutrina cristã.
  10. Maria, Mãe e Discípula Missionária — modelo e intercessora para a Igreja em missão.

O documento é estruturado segundo o método “ver, julgar e agir”, dando enfoque em quatro partes principais: 

  1. A vida dos nossos povos hoje: Analisa a realidade sociocultural, económica e religiosa da América Latina e do Caribe, reconhecendo os desafios e os “rostos sofredores” dos povos, especialmente os pobres e excluídos.
  2. O mistério de Jesus Cristo: Aprofunda a chamada a ser discípulos e missionários de Cristo, incentivando um encontro pessoal e comunitário com Ele. O documento enfatiza a união inseparável entre ser discípulo e ser missionário.
  3. As linhas pastorais para a missão: Propõe prioridades e ações para a missão da Igreja, com um enfoque na “conversão pastoral” e na necessidade de passar de uma pastoral de mera conservação para uma decididamente missionária. Aborda a importância da missão continental e a renovação das paróquias.
  4. Recursos e condições para a missão: Indica os meios para cumprir a missão, incluindo a comunhão eclesial, a formação dos agentes pastorais e a oração, inspirando-se no exemplo de Maria. 

A Aprovação e Publicação

Após intensas discussões e revisões, o texto foi aprovado pelos bispos e submetido ao Papa Bento XVI, que autorizou a sua publicação em 29 de junho de 2007, dando-lhe autoridade magisterial.

O documento foi apresentado oficialmente ao povo de Deus e rapidamente se tornou referência pastoral para toda a Igreja na América Latina e além.

O Papa Bento XVI elogiou a clareza e a fidelidade doutrinal do texto, destacando-o como um dos frutos mais significativos da colegialidade episcopal e da comunhão com a Sé de Pedro.

Impacto e Atualidade

O impacto do Documento de Aparecida foi profundo e duradouro. Ele marcou uma nova etapa na evangelização do continente latino-americano, enfatizando a necessidade de formar discípulos missionários e não apenas católicos nominais.

O texto inspirou inúmeros planos pastorais, encontros diocesanos e iniciativas missionárias em toda a América Latina.

O Papa Francisco, que participou ativamente na sua redação, reconhece-o como um marco espiritual do seu pensamento. A sua exortação apostólica Evangelii Gaudium (2013) retoma muitas ideias e expressões do documento, adaptando-as à realidade global.

Além disso, o Documento de Aparecida teve influência direta em diversas conferências episcopais e em movimentos de renovação pastoral e missionária em todo o mundo, sendo considerado por muitos teólogos o “texto programático do século XXI” para a Igreja na América Latina.

Conclusão

O Documento de Aparecida (que pode ser consultado aqui) continua a ser um ponto de referência fundamental para compreender a missão da Igreja no mundo contemporâneo. Nascido da escuta do Espírito Santo e do discernimento comunitário dos bispos, ele convida todos os cristãos a viverem uma fé madura, comprometida e evangelizadora.

Ao recordar que Maria, a Mãe Aparecida, é discípula e missionária por excelência, o documento reafirma que a Igreja, como ela, deve “sair apressadamente” ao encontro dos irmãos, levando a alegria do Evangelho a todos os povos.

“Não podemos ficar tranquilos, à espera, de braços cruzados, dentro das nossas igrejas, enquanto tantos têm sede de Deus.” (Documento de Aparecida, n.º 548)

Que o Espírito Santo continue a renovar na Igreja a chama missionária de Aparecida, fazendo de cada batizado um testemunho vivo da presença de Cristo no mundo.

Partilha esta publicação:

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *