Neste dia, em 1979, o Papa João Paulo II agradecia a Santa Edwiges pela sua eleição

Quando, a 16 de outubro de 1978, o cardeal Karol Józef Wojtyła foi eleito Papa e assumiu o nome de João Paulo II, o mundo católico presenciou um momento histórico: pela primeira vez em 455 anos, um não italiano ascendia ao trono de São Pedro. Mas para o novo Papa, este facto não era apenas um marco político ou eclesiástico, era, acima de tudo, um sinal da Providência Divina. E foi com essa fé que ele, poucos meses depois, regressou à sua terra natal para agradecer a Santa Edwiges da Silésia (Święta Jadwiga Śląska) pela sua eleição e pelo caminho que Deus lhe havia traçado.

No dia 5 de junho de 1979, durante a sua primeira viagem apostólica à Polónia, João Paulo II celebrou uma missa no Santuário de Jasna Góra, em Częstochowa, e manifestou publicamente a sua profunda gratidão a Santa Edwiges, uma das mais veneradas santas do país. Esse gesto, cheio de simbolismo, uniu a história da Igreja polaca com o início de um dos pontificados mais marcantes da era moderna.

Quem foi Santa Edwiges da Silésia

Santa Edwiges (ou Jadwiga) da Silésia nasceu em 1174, no seio da nobreza bávara, no castelo de Andechs, na atual Alemanha. Casou-se ainda jovem com o duque Henrique I, o Barbudo, governante da Silésia, uma das regiões mais ricas do reino polaco.

Mulher de profunda fé e caridade, Edwiges destacou-se por:

  • Apoiar os pobres e doentes, fundando hospitais e instituições de caridade;
  • Promover a reconciliação entre príncipes e famílias em tempos de guerra;
  • Viver com espírito de penitência e humildade, mesmo como duquesa;
  • Fomentar a fé católica e a cultura na Silésia, incentivando a construção de igrejas e mosteiros.

Após a morte do marido, retirou-se para o Mosteiro de Trzebnica, fundado por ela e onde viveu até à sua morte, em 1243.
Foi canonizada pelo Papa Clemente IV em 1267, e tornou-se padroeira da Silésia e da Polónia.

Santa Edwiges é recordada como modelo de caridade, de entrega e de serviço, uma mulher que, apesar de viver na corte, abraçou a simplicidade evangélica e fez da misericórdia o centro da sua vida.

A eleição de João Paulo II: um acontecimento providencial

Quando Karol Wojtyła foi eleito Papa em 1978, o mundo ainda vivia sob a tensão da Guerra Fria e a Polónia encontrava-se sob o domínio comunista. A eleição de um papa polaco foi vista como um sinal de esperança e de libertação espiritual para todo o povo eslavo.

Wojtyła, nascido em Wadowice, em 1920, era profundamente devoto da Virgem Maria, a quem consagrou o seu pontificado com o lema Totus Tuus (“Todo Teu”). Contudo, a sua espiritualidade também era fortemente marcada pela devoção aos santos da sua pátria, entre eles Santa Edwiges.

Ele próprio recordou várias vezes, em discursos e homilias, que a fé polaca foi moldada por figuras como São Estanislau de Cracóvia, Santa Edwiges da Silésia, Santa Faustina Kowalska e São Maximiliano Kolbe, todos exemplos de fidelidade a Cristo em tempos de sofrimento e provação.

Para João Paulo II, a eleição papal foi um mistério de graça ligado à história espiritual da sua terra:

Não seria possível compreender o que aconteceu em 16 de outubro de 1978 sem recordar esta terra, sem recordar a sua história e os seus santos”, diria mais tarde.

A visita a Jasna Góra — o coração espiritual da Polónia

A primeira viagem apostólica de João Paulo II foi à sua própria terra, de 2 a 10 de junho de 1979.
Foi uma visita histórica: a primeira de um Papa a um país comunista, e um momento que inspiraria profundamente o despertar espiritual e social que culminaria, anos depois, no movimento “Solidarność” (Solidariedade).

No centro da visita estava o Santuário de Jasna Góra, em Częstochowa, casa do ícone milagroso da Virgem Negra, considerado o coração espiritual da nação.

Ali, a 5 de junho de 1979, João Paulo II celebrou uma missa solene diante de centenas de milhares de peregrinos. Durante a homilia, o Papa dirigiu palavras de gratidão a Santa Edwiges, reconhecendo a intercessão da santa no caminho que o levou ao pontificado.

O agradecimento de João Paulo II a Santa Edwiges

Na homilia dessa missa, João Paulo II fez referência direta à proteção e intercessão de Santa Edwiges, a quem atribuiu a sua eleição e missão como Papa.

Ele disse:

Dou graças a Deus por ter nascido nesta terra, que deu à Igreja tantos santos, e entre eles Santa Edwiges, exemplo luminoso de amor e fidelidade.
Foi sob o seu olhar e o da Mãe de Jasna Góra que aprendi o que significa servir a Igreja com todo o coração.
A ela, Santa Edwiges, padroeira da Polónia, confio o meu pontificado, pedindo que, como mulher de paz e caridade, continue a interceder pela unidade e pela fé deste povo
.”

O Papa quis, assim, ligar o início do seu pontificado à tradição espiritual da Polónia, reconhecendo que a fé do seu povo e a herança dos seus santos foram fundamentais para a sua vocação e missão.

Esta atitude de gratidão tinha também um forte significado político e pastoral: evocava a identidade católica da Polónia diante do regime ateu comunista, reafirmando a força espiritual do país e a presença viva da fé mesmo em tempos de opressão.

Santa Edwiges e a espiritualidade de João Paulo II

A figura de Santa Edwiges sempre exerceu um profundo fascínio sobre João Paulo II.
Para ele, ela era um exemplo de união entre ação e contemplação, uma mulher de oração e de obras concretas, que serviu os pobres e defendeu a dignidade humana — valores centrais do seu próprio pontificado.

Assim como Santa Edwiges promoveu a reconciliação e a paz entre os povos da sua época, João Paulo II seria, nos séculos XX e XXI, o Papa da paz e do perdão, mediando conflitos, pedindo reconciliação entre religiões e defendendo a dignidade de todos os povos.

A espiritualidade de Santa Edwiges também refletia o amor pela Cruz e pela pobreza, algo que João Paulo II expressou ao longo da vida, especialmente na sua doença e sofrimento final, quando mostrou ao mundo o valor redentor da dor vivida com fé.

O significado espiritual do agradecimento

O agradecimento do Papa a Santa Edwiges não foi apenas uma expressão pessoal de devoção, mas também um gesto de fidelidade à memória espiritual da Polónia.
Num tempo em que o regime comunista tentava silenciar a fé, o Papa polaco recordou ao seu povo que as raízes cristãs da nação são mais fortes do que qualquer ideologia.

A sua peregrinação e oração em Jasna Góra, com referência a Santa Edwiges, foram um ato de confiança:

  • Confiança na Providência Divina;
  • Confiança na intercessão dos santos;
  • Confiança no poder transformador da fé vivida com coragem.

Legado e memória

Hoje, ao recordar a primeira visita papal de João Paulo II à Polónia, a figura de Santa Edwiges permanece intimamente ligada a esse momento.
Nas homilias, nas orações e nos discursos do Papa, o nome da santa continua a surgir como símbolo da fidelidade à fé em tempos difíceis.

Em Trzebnica, onde repousam as relíquias de Santa Edwiges, foi erguido um monumento em honra de João Paulo II, em reconhecimento por ter sido o primeiro Papa a invocar oficialmente a intercessão da santa como agradecimento pela sua eleição.

Conclusão — A gratidão de um filho da Polónia

No dia 5 de junho de 1979, em Jasna Góra, São João Paulo II não falou apenas como Papa — falou como um filho da Polónia, que regressava à sua casa espiritual para agradecer.
Agradeceu à Mãe de Deus de Częstochowa e à Santa Edwiges da Silésia, duas mulheres que marcaram profundamente a fé e a história do seu povo.

Aquela missa ficou para sempre gravada na memória dos fiéis: um Papa recém-eleito, de joelhos diante de Nossa Senhora e de Santa Edwiges, reconhecendo que tudo vem de Deus e tudo deve voltar a Ele.

Agradeço-te, Santa Edwiges, pela tua intercessão, pela tua fidelidade e pelo testemunho que deixaste à nossa pátria. Que eu possa servir a Igreja com o mesmo amor com que tu serviste Cristo.”
São João Paulo II, Jasna Góra, 5 de junho de 1979

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