A devoção ao Senhor dos Milagres, também chamado Cristo de Pachacamilla, nasceu no coração do Peru no século XVII e é hoje um dos maiores símbolos de fé da Igreja Católica na América Latina. A imagem de Cristo Crucificado, pintada humildemente numa parede de adobe, sobreviveu a terramotos e maremotos, tornando-se sinal da proteção divina e esperança para milhões de fiéis.
A pintura do escravo angolano
Em 1651, um escravo vindo de Angola pintou numa parede de adobe, no bairro de Pachacamilla (Lima), a imagem de Jesus na Cruz, rodeado pela Virgem e por São João Evangelista. A obra era simples, mas carregada de profunda espiritualidade. Os escravos e habitantes da região começaram a reunir-se diante dela para rezar.
O terramoto de 1655
A primeira grande prova da força desta devoção aconteceu em 13 de novembro de 1655, quando um violento terramoto atingiu Lima. Grande parte da cidade ruiu, incluindo igrejas e casas de pedra, mas a frágil parede de adobe onde estava pintada a imagem de Cristo permaneceu intacta. O fenómeno foi considerado um milagre e a notícia espalhou-se rapidamente, levando cada vez mais fiéis a venerar o Cristo de Pachacamilla.
O maremoto e o terramoto de 1687
Em 20 de outubro de 1687, um novo desastre natural assolou o Peru: um forte terramoto seguido de um maremoto devastou Lima e o porto de Callao. Mais uma vez, o edifício onde se encontrava a pintura ficou gravemente danificado, mas a parede com o Cristo Crucificado resistiu incólume.
Foi nesse mesmo ano que, pela primeira vez, a imagem foi levada em procissão pelas ruas de Lima, como expressão de agradecimento e súplica pela proteção divina. Nascia, assim, a tradição que viria a transformar-se na maior procissão católica do mundo.
O terramoto de 1746
Outro marco da devoção ocorreu em 28 de outubro de 1746, quando Lima sofreu o mais violento terramoto da sua história, seguido de um maremoto que destruiu quase por completo o porto de Callao. Mais uma vez, a parede com a imagem milagrosa resistiu sem qualquer dano.
A partir desta data, o dia 28 de outubro passou a ser celebrado como a grande festa do Senhor dos Milagres, reunindo multidões de fiéis em honra de Cristo Crucificado.
A devoção até hoje
Os milagres de 1655, 1687 e 1746 solidificaram a fé no Senhor dos Milagres, que deixou de ser apenas uma devoção local para se tornar um símbolo nacional do Peru.
Todos os anos, no mês de outubro, conhecido como o “Mês Morado”, milhões de fiéis acompanham as procissões em Lima e em várias cidades do mundo onde a devoção se espalhou. O andor, ricamente ornamentado, percorre as ruas entre cânticos, orações e promessas, num dos maiores atos de fé popular do planeta.
Conclusão
O Senhor dos Milagres é, para o povo peruano, o Cristo que não cai, mesmo quando tudo desmorona. A sua imagem, sobrevivendo milagrosamente a terramotos e maremotos, continua a transmitir uma mensagem de esperança: a fé em Cristo é a rocha firme que sustenta a vida dos crentes em meio às provações.
Assim, o Senhor dos Milagres tornou-se não apenas padroeiro de Lima, mas também uma das expressões mais autênticas da fé viva que une os povos da América Latina e além.