A bula Manifestis Probatum, emitida pelo Papa Alexandre III a 23 de maio de 1179, é um dos documentos mais importantes da história de Portugal. Este decreto papal reconheceu oficialmente a independência do Reino de Portugal e concedeu ao seu monarca, D. Afonso Henriques, o título de Rei de Portugal. Esta decisão teve um impacto profundo na consolidação do jovem reino e na sua afirmação no contexto europeu e cristão da Idade Média.
Contexto histórico
No século XII, a Península Ibérica encontrava-se dividida entre vários reinos cristãos e territórios sob domínio muçulmano. O Condado Portucalense, então parte do Reino de Leão, era governado por D. Afonso Henriques, filho do Conde D. Henrique e de D. Teresa, filha do rei Afonso VI de Leão.
Após a morte do pai, D. Afonso Henriques entrou em conflito com a sua mãe e, mais tarde, com o Reino de Leão, procurando afirmar a sua autonomia. A Batalha de São Mamede (1128) marcou um ponto de viragem, pois D. Afonso Henriques derrotou as forças leais a D. Teresa e assumiu o controlo do Condado Portucalense.
Nos anos seguintes, o monarca consolidou o seu poder e expandiu o território para sul, combatendo os mouros no contexto da Reconquista Cristã. Em 1139, após a vitória na Batalha de Ourique, D. Afonso Henriques proclamou-se Rei de Portugal, mas o reconhecimento internacional demoraria ainda vários anos.
A luta pelo reconhecimento da independência
Embora tivesse consolidado o seu domínio em Portugal, D. Afonso Henriques precisava de obter o reconhecimento da sua soberania por parte das potências cristãs, especialmente da Santa Sé. O Reino de Leão, liderado por Afonso VII, continuava a considerar Portugal como um vassalo leonês, o que impedia o reconhecimento oficial da independência.
D. Afonso Henriques adotou uma estratégia diplomática cuidadosa para garantir o apoio da Igreja. Concedeu privilégios a várias ordens religiosas, como os Templários e os Hospitalários, e promoveu a construção de mosteiros e igrejas, reforçando a identidade cristã do seu reino. Além disso, comprometeu-se a pagar um tributo à Santa Sé, tornando Portugal um reino vassalo do Papa, algo que fortaleceu os seus laços com Roma.
A diplomacia portuguesa começou a dar frutos quando o Papa Adriano IV e, mais tarde, o Papa Alexandre III mostraram interesse em reconhecer a soberania de Portugal. Este último, envolvido numa disputa com o Imperador Frederico Barbarossa, procurava aliados na Europa Ocidental e viu em Portugal um potencial parceiro.
A emissão da bula Manifestis Probatum
No dia 23 de maio de 1179, o Papa Alexandre III promulgou a bula Manifestis Probatum, na qual reconhecia D. Afonso Henriques como Rei de Portugal e aceitava Portugal como um reino independente.
O documento justificava esta decisão com base nos feitos militares de D. Afonso Henriques contra os mouros e na sua dedicação à causa cristã. O Papa reconhecia que o monarca tinha demonstrado mérito e valentia na defesa da fé, razão pela qual concedia o título régio e confirmava a separação de Portugal do Reino de Leão.
Trecho da bula Manifestis Probatum
“Manifestamente é provado que vós, caríssimo filho em Cristo, Afonso, ilustre rei de Portugal, com a ajuda de Deus, tendes arrancado das mãos dos sarracenos, com grande esforço e trabalho, o vosso reino, que, com a vossa valentia, fizestes cristão. Assim, reconhecemos a vossa dignidade real e vos concedemos, com aprovação apostólica, o título de Rei.”
Com este documento, Portugal passava a ser reconhecido como um reino independente dentro da cristandade ocidental, sob a proteção da Santa Sé.
Consequências da bula Manifestis Probatum
A bula papal teve um impacto profundo na consolidação de Portugal como estado soberano. As suas principais consequências foram:
- Reconhecimento oficial de Portugal como reino independente, afastando juridicamente qualquer pretensão de vassalagem ao Reino de Leão.
- Legitimação da autoridade de D. Afonso Henriques como monarca, consolidando o seu poder interno e reforçando o apoio da nobreza e do clero.
- Fortalecimento dos laços com a Igreja Católica, garantindo apoio espiritual e político para futuras conquistas no contexto da Reconquista.
- Integração plena de Portugal no mundo cristão europeu, permitindo o estabelecimento de alianças com outros reinos e a participação em eventos políticos da época.
Embora o Reino de Leão tenha resistido à ideia de independência portuguesa, a bula papal tornou qualquer contestação difícil. O reconhecimento do Papa teve um peso significativo e, ao longo dos anos, foi fundamental para consolidar a posição de Portugal como um reino independente.
O significado da bula Manifestis Probatum nos dias de hoje
O documento permanece como um dos mais importantes da história de Portugal, representando o marco oficial da independência do país. A bula simboliza a relação especial entre Portugal e a Igreja Católica, que se manteve ao longo dos séculos.
Atualmente, 23 de maio é uma data simbólica na história de Portugal, pois assinala o reconhecimento oficial da soberania nacional. O conteúdo da bula é estudado em contextos académicos e históricos como um exemplo da importância da diplomacia e da influência do poder papal na formação dos estados europeus medievais.
Conclusão
A bula Manifestis Probatum, emitida pelo Papa Alexandre III em 1179, foi um passo decisivo na afirmação de Portugal como um reino independente. O reconhecimento papal fortaleceu o poder de D. Afonso Henriques e consolidou a posição do país na cristandade europeia.
Ao longo da história, esta bula tornou-se um dos documentos mais relevantes da identidade portuguesa, marcando o início oficial do Reino de Portugal e estabelecendo a nação como parte fundamental do mundo cristão ocidental.