Neste dia, em 325, o Credo Niceno original era adotado pela primeira vez no Primeiro Concílio de Nicéia

O Credo Niceno, proclamado pela primeira vez no Primeiro Concílio de Niceia, em 325 d.C., é um dos textos mais fundamentais da fé cristã. Representa a primeira formulação solene e universal da doutrina trinitária, estabelecendo de forma clara a divindade de Jesus Cristo e a sua consubstancialidade com o Pai. A sua adoção marcou um momento decisivo na história da Igreja, unindo os cristãos em torno de uma profissão de fé comum e combatendo as heresias que ameaçavam a unidade e a verdade da fé.

Contexto histórico — A Igreja após as perseguições

No início do século IV, o cristianismo vivia um momento de transição. Após séculos de perseguição sob o Império Romano, a situação mudou radicalmente com o Édito de Milão, promulgado em 313 d.C. pelo imperador Constantino, que concedeu liberdade de culto aos cristãos.

Com a paz religiosa, a Igreja pôde finalmente reunir-se livremente, organizar a sua hierarquia e refletir sobre questões doutrinais. Contudo, essa nova liberdade trouxe também desafios: divergências teológicas que antes estavam dispersas começaram a ganhar força e a dividir comunidades inteiras.

O maior desses conflitos foi a controvérsia ariana, iniciada pelo presbítero Ário, de Alexandria, que negava a plena divindade de Cristo.

A heresia ariana e a crise doutrinal

Ário (c. 256–336) ensinava que Jesus Cristo não era Deus verdadeiro, mas uma criatura elevada, criada por Deus Pai “antes de todos os séculos”, e portanto não coeterno nem consubstancial com Ele.
Esta doutrina rapidamente se espalhou pelo mundo cristão, especialmente no Oriente, provocando divisões profundas.

Os defensores da ortodoxia, liderados por Santo Atanásio e outros bispos de Alexandria, reagiram afirmando que Cristo é verdadeiro Deus, da mesma substância (homoousios) do Pai, e que negar isso seria destruir o próprio núcleo da fé cristã.

O conflito teológico tornou-se também uma questão política, pois ameaçava a unidade do recém-convertido Império Romano cristão.

A convocação do Primeiro Concílio de Niceia

Diante dessa situação, o imperador Constantino, desejando preservar a unidade religiosa e política, convocou um concílio ecuménico — o primeiro na história da Igreja — a realizar-se na cidade de Niceia (atual İznik, Turquia), em 325 d.C.

Participaram cerca de 300 bispos, na maioria provenientes das províncias orientais do Império, embora também estivessem presentes representantes do Ocidente, incluindo Ossio de Córdova, enviado pelo Papa Silvestre I.

O Concílio foi presidido pelo imperador, que não interveio nas decisões doutrinais, mas encorajou o consenso e a reconciliação entre as partes.

A formulação do Credo Niceno

O principal objetivo do Concílio era definir a natureza de Jesus Cristo em relação ao Pai.

Depois de longas discussões, a maioria dos bispos, a 19 de junho de 325 d.C., rejeitou as teses arianas e aprovou uma profissão de fé, o Credo de Niceia, que afirmava com clareza a divindade do Filho e a sua consubstancialidade com o Pai.

O texto original, redigido em grego, continha as seguintes afirmações essenciais:

Cremos em um só Deus, Pai todo-poderoso, criador de todas as coisas visíveis e invisíveis.
E em um só Senhor, Jesus Cristo, o Filho de Deus, gerado do Pai, unigénito, isto é, da substância do Pai, Deus de Deus, luz da luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado, não criado, consubstancial ao Pai; por quem todas as coisas foram feitas, tanto as do céu como as da terra; que por nós, homens, e pela nossa salvação, desceu e se encarnou, e padeceu, e ressuscitou ao terceiro dia, e subiu aos céus, e virá julgar os vivos e os mortos.
E no Espírito Santo
.”

O Credo terminava com uma condenação explícita aos ensinamentos de Ário, declarando anátema a quem dissesse que “houve um tempo em que o Filho não existia”.

O termo grego homoousios (ὁμοούσιος), que significa “da mesma substância”, tornou-se o ponto central da ortodoxia cristológica. Essa palavra garantiu a plena igualdade entre o Pai e o Filho, afastando qualquer ideia de subordinação.

As consequências imediatas do Concílio

A adoção do Credo Niceno foi um marco histórico, mas não encerrou de imediato as controvérsias.
Embora o concílio tenha condenado Ário e exilado os seus apoiantes, a heresia ariana continuou a espalhar-se, encontrando apoio entre vários imperadores e bispos orientais nas décadas seguintes.

Santo Atanásio, defensor firme da ortodoxia nicena, sofreu perseguições e exílios sucessivos por manter a fé do Concílio. A paz doutrinal só seria alcançada com o Primeiro Concílio de Constantinopla, em 381 d.C., que confirmou e ampliou o Credo de Niceia, incluindo uma formulação mais completa sobre o Espírito Santo. Essa versão posterior é conhecida como o Credo Niceno-Constantinopolitano, recitado até hoje na liturgia católica e ortodoxa.

A importância teológica do Credo Niceno

O Credo Niceno foi o primeiro símbolo de fé universalmente aceite pela Igreja.
A sua importância teológica é imensa, pois:

  • Define de forma clara a divindade de Cristo e a sua igualdade com o Pai;
  • Introduz o conceito de consubstancialidade (homoousios), que se tornou base da teologia trinitária;
  • Representa o início da doutrina trinitária sistematizada, que seria completada mais tarde com o ensino sobre o Espírito Santo;
  • Estabelece o modelo dos futuros concílios ecuménicos, como instrumentos de definição e defesa da fé católica.

O Credo Niceno na liturgia e na vida cristã

Com o passar dos séculos, o Credo Niceno tornou-se parte integrante da liturgia da Igreja.
Recitado especialmente na Missa dominical e nas grandes solenidades, ele é o símbolo da unidade da fé, comum a católicos, ortodoxos e a muitas confissões protestantes históricas.

Cada vez que o fiel proclama “Creio em um só Deus”, une-se à confissão de fé professada por aqueles primeiros bispos em Niceia, reafirmando a verdade central do cristianismo — que Jesus Cristo é verdadeiro Deus e verdadeiro homem, salvador da humanidade.

Este credo é distinto da versão mais longa que é recitada hoje nas igrejas. A versão moderna (o Credo Niceno-Constantinopolitano) foi expandida no Concílio de Constantinopla em 381 d.C. para abordar mais detalhadamente o Espírito Santo.

Conclusão

O Primeiro Concílio de Niceia, em 325 d.C., e a adoção do Credo Niceno foram acontecimentos decisivos na história da Igreja.
Perante a ameaça das heresias e a necessidade de unidade, a Igreja, guiada pelo Espírito Santo, definiu de modo solene o mistério central da fé cristã: a divindade de Cristo e a sua eterna comunhão com o Pai e o Espírito Santo.

Desde então, o Credo Niceno permanece como coluna vertebral da fé cristã, ecoando há mais de mil e setecentos anos nas igrejas do mundo inteiro — um testemunho perene da verdade professada pelos primeiros discípulos e confirmada pela Igreja universal:

Cremos em um só Senhor, Jesus Cristo, Filho unigénito de Deus, gerado do Pai antes de todos os séculos: Deus de Deus, luz da luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro.

Partilha esta publicação:

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *