A Igreja da Multiplicação dos Pães e Peixes, também chamada Igreja da Multiplicação (ou Church of the Multiplication of the Loaves and Fish), situada em Tabgha, na costa noroeste do Mar da Galileia, é um lugar de profunda devoção cristã. É venerada como o local onde Jesus realizou o milagre da multiplicação dos cinco pães e dois peixes para alimentar cinco mil pessoas.
Ao longo dos séculos, esta igreja passou por várias transformações, destruições e renascimentos, como tantos lugares santos, sendo também alvo de maldade humana. O episódio de vandalismo de 2015 marcou dolorosamente a comunidade cristã local e universal, mas também demonstrou a força da fé e da reconciliação.
Origens e primeira construção
A tradição cristã identifica Tabgha como o local do milagre da multiplicação dos pães e peixes. O nome Tabgha deriva do grego Heptapegon, “sete fontes”, por causa de todas as nascentes de água doce existentes ali, tornando a região um lugar de repouso, sombra e provisão.
A primeira igreja construída no local data do século IV, por volta do ano c. 350 d.C., quando o cristianismo já se difundia pela Terra Santa. A construção inicial provavelmente era simples, dedicada a marcar o local do milagre.
No século V (~480), a igreja foi ampliada consideravelmente, adquirindo mosaicos de pavimento, ornamentos e estrutura mais majestosa, sob o patriarcado de Martyrius de Jerusalém.
Destruição, redescoberta e reconstruções
Em 614 d.C., os exércitos persas destruíram a igreja bizantina. Depois disso, o local caiu no esquecimento durante muitos séculos, embora peregrinos medievais mencionassem uma capela ou ruínas.
Em 1888 foi adquirido pelo German Catholic Society for Palestine, que efetuou escavações no início do século XX (na década de 1930) e descobriu os mosaicos do século V, os alicerces do edifício antigo, e o “bloco de calcário” venerado como a pedra onde o pão e os peixes foram colocados por Jesus no milagre.
A igreja atual, em estilo que respeita muitos elementos bizantinos, foi construída em 1982, sobre as fundações do edifício do século V.
Elementos notáveis de arte e liturgia
O mosaico do assoalho no transepto da igreja é famoso: nele se veem dois peixes flanqueando um cesto de pães, símbolo do milagre, além de fauna, flora aquática e motivos naturais locais.
Sob o altar há uma pedra de calcário identificada como aquela sobre a qual Jesus teria realizado o milagre. Ela é objeto de veneração.
O ato de vandalismo de 2015
Na madrugada de 17 de junho de 2015, foi perpetrado um ato de vandalismo e incêndio criminoso em parte das dependências do complexo da Igreja da Multiplicação em Tabgha.
Dois cômodos do complexo (salas de escritório, armazenamento de livros e uma ala de eventos) foram atingidos pelo fogo, causando danos consideráveis. A igreja principal e os mosaicos centrais antigos não foram destruídos, embora tenham sofrido danos pelo fumo.
Nos muros foram pintadas frases em hebraico com grafites anti-cristãos, como “False idols will be smashed” (“ídolos falsos serão destruídos”) e “Pagans” (“pagãos”).
A polícia israelita prendeu vários jovens extremistas judeus, alguns deles identificados como pertencentes ao movimento conhecido como “Hilltop Youth”. Houve indiciamentos.
O incidente provocou forte comoção internacional e interconfessional. Autoridades israelitas condenaram firmemente o crime. Houve manifestações de solidariedade de cristãos, inclusive com participação de figuras políticas.
A restauração do dano levou cerca de 8 meses, com custo estimado em aproximadamente US$ 1.000.000, dos quais uma parte (cerca de US$ 400.000) foi custeada pelo governo israelita.
A igreja reabriu em Fevereiro de 2017, em cerimônia inter-religiosa que contou com autoridades cristãs, do governo e de outras comunidades religiosas, demonstrando compromisso com a liberdade de culto.
Significado espiritual, lições e impacto
O local da multiplicação é para os cristãos um símbolo poderoso da providência de Deus, da generosidade de Jesus e do convite à confiança nos recursos que Ele dá. A presença da pedra venerada e mosaicos reforça a experiência palpável da fé.
O vandalismo foi uma ferida espiritual, lembrando que ainda existe intolerância religiosa. Porém, a rápida reconstrução, o envolvimento de autoridades e o apoio de peregrinos mostraram que a fé cristã não se deixa abater.
A reabertura com participação inter-religiosa enviou mensagem de reconciliação, de respeito mútuo, e de que o patrimônio espiritual cristão é parte do patrimônio comum da humanidade.
Conclusão
A Igreja da Multiplicação dos Pães e Peixes em Tabgha é um exemplo vivo de como a memória cristã, a arqueologia, a arte e a espiritualidade se entrelaçam. Desde as suas origens bizantinas, passando pelas ruínas e esquecimento, até à reconstrução moderna, ela permanece um lugar de encontro com o milagre. O episódio de 2015 foi um momento doloroso, mas também uma oportunidade para reafirmar que a luz da fé não é apagada pela maldade humana.
Que cada peregrino que visita Tabgha possa sair renovado na fé de que Cristo multiplica o pouco que temos, e que o amor, quando partilhado, basta — é talvez a maior mensagem que se pode extrair desse lugar santo.