No dia 12 de maio de 1982, durante a visita de agradecimento do Papa João Paulo II ao Santuário de Fátima em Portugal, deu-se uma tentativa de atentado contra a sua vida. Este incidente, muitas vezes ligado ao precedente mais grave de 13 de maio de 1981 em Roma, é uma página significativa da história da Igreja, da devoção mariana e da missão pontifícia.
Contexto antes de Fátima
No ano anterior, 13 de maio de 1981, João Paulo II havia sido gravemente ferido em Roma por Mehmet Ali Ağca. A data da tentativa (13 de maio) correspondia à festa de Cova da Iria e ao aniversário da primeira aparição mariana de 1917 em Fátima, facto que o Papa interpretou como intervenção materna de Maria sobre o seu destino.
Por esse motivo, em maio de 1982 João Paulo II decidiu fazer uma peregrinação de ação de graças ao Santuário de Fátima, precisamente para agradecer a Nossa Senhora de Fátima por lhe ter salvo a vida.
O atentado em Fátima: o que aconteceu
Durante a sua estadia em Fátima, entre 12 e 15 de maio de 1982, o Papa participava em atos litúrgicos no Santuário, acompanhado por milhares de peregrinos.
Na tarde de 12 de maio, durante uma procissão de velas ou depois de uma celebração, o sacerdote espanhol Juan María Fernández y Krohn aproximou-se do Papa com uma baioneta escondida. Ele teria gritado palavras de revolta contra o Papa e contra o Concílio Vaticano II.
O agressor atacou João Paulo II, mas não conseguiu feri-lo gravemente. A segurança do Santuário interveio rapidamente e impediu que o incidente evoluísse para algo mais sério. A imprensa portuguesa reportou que o Papa ficou “abalado, mas não ferido” durante o acontecimento.
Embora a Santa Sé não o tenha divulgado na altura, o Papa foi ferido de raspão durante o ataque. A informação só foi revelada anos mais tarde pelo então secretário particular, o cardeal Stanislaw Dziwisz.
Quem foi o autor e as motivações
Juan María Fernández y Krohn era — na altura — padre espanhol tradicionalista, crítico das reformas do Concílio Vaticano II. Ele próprio declarou que o seu ato visava manifestar-se contra o Papa e contra a abertura pós-conciliar.
Krohn acreditava numa teoria conspiratória radical: dizia que João Paulo II era um agente comunista infiltrado no Vaticano, responsável por “trair a Igreja” ao promover reformas do Concílio Vaticano II, o ecumenismo e o diálogo com o mundo moderno. Em suas palavras, ele queria “libertar a Igreja” — tentando matar o Papa.
Após o ataque, foi detido pelas autoridades portuguesas. Krohn foi condenado a 6 anos e meio de prisão, depois expulso de Portugal. Anos mais tarde, foi preso novamente por invadir um consulado com uma espada.
Relação entre o atentado de Roma e o de Fátima
Embora o atentado de Roma tenha sido mais grave, o de Fátima tem um forte significado simbólico e espiritual.
A visita de João Paulo II a Fátima em maio de 1982 tinha como propósito agradecer pela sua salvação em 1981. O facto de o segundo atentado ocorrer praticamente nas vésperas da data de 13 de maio, num local vinculado à mensagem mariana que o Papa tanto invocava, reforçou a sua convicção de que Maria o guardava.
João Paulo II via-se a si mesmo como “peregrino de Fátima” e como alguém que lhe devia a vida, o que reforçou a ligação entre o Santuário e o pontificado.
Consequências para o Papa e para Fátima
O Papa, após o episódio, reafirmou publicamente a sua fé em Maria e incluiu o Santuário de Fátima como um dos pilares da sua espiritualidade.
O santuário, por seu lado, viu reforçar-se a devoção e a peregrinação internacional, graças ao vínculo simbólico com o ato de 1982. O acontecimento tornou-se expressão de que o “caminho do Papa” não estava isento de prova, o que muitas vezes aproximou ainda mais João Paulo II dos crentes que sofriam.
Na sua mensagem, o Papa vinculou o ataque à convicção de que a Providência divina e a intercessão de Maria podem alterar os desígnios humanos, reforçando a importância da oração, da confiança e da consagração mariana.
Significado espiritual para os fiéis
Este episódio convida-nos a refletir sobre vários temas cristãos profundos:
- Proteção mariana: o Papa interpretou este atentado como intervenção de Maria, o que fortalece a devoção mariana e a confiança no cuidado de Deus através de Nossa Senhora.
- Cruz-e-glória: mesmo o sucessor de Pedro viveu a fragilidade e a violência humana, o que aproxima o ministério petrino das experiências comuns de sofrimento.
- Missão e fidelidade: João Paulo II continuou o seu pontificado com renovada missão, mostrando que a fé não se retira perante a agressão, mas se fortalece.
- Fátima como lugar de ação de graças e conversão: o Santuário tornou-se lugar de agradecimento, compromisso e anúncio da paz, como Maria pediu em 1917.
Conclusão
O atentado sofrido por João Paulo II em Fátima, ainda que menos conhecido que o de Roma, constitui um momento importante da história contemporânea da Igreja. Ele revela que mesmo o pontificado pode passar pela provação, que Maria é verdadeiramente “Mãe da Igreja” e que Fátima ocupa um lugar relevante na espiritualidade do século XX.
Para nós, hoje, é convite à confiança na Virgem Maria, à oração perseverante, à missão de testemunhar a fé mesmo nas adversidades — tal como João Paulo II o fez.
“À beira do mistério, confiei-me à Mãe de Deus e Ela não me abandonou.” — João Paulo II