A Igreja Católica, ao longo dos séculos, tem inspirado homens e mulheres a fundarem instituições de serviço aos mais pobres, doentes e marginalizados. Entre essas obras destaca-se a Ordem Hospitaleira de São João de Deus, fundada no século XVI por São João de Deus (1495-1550), cuja vida e exemplo marcaram profundamente a história da caridade cristã.
A origem da Ordem Hospitaleira
São João de Deus nasceu em Montemor-o-Novo, em 1495. Depois de uma juventude marcada por aventuras, trabalho militar e busca de sentido, converteu-se profundamente ao ouvir a pregação de São João de Ávila. Esta experiência levou-o a dedicar a sua vida ao cuidado dos doentes e pobres em Granada, Espanha.
Em 1539 fundou o seu primeiro hospital, caracterizado por um novo espírito de acolhimento integral: não apenas cuidados médicos, mas também atenção espiritual, higiene, alimentação e dignidade humana. A sua forma de servir chamou a atenção de muitos que se uniram a ele. Após a sua morte, em 1550, os seguidores continuaram a obra, que mais tarde se estruturou como Ordem Hospitaleira de São João de Deus, aprovada oficialmente pela Santa Sé em 1572.
Carisma e missão da Ordem
A Ordem tem como lema “Fazer o bem, bem feito”, expressão do espírito de São João de Deus. A missão é clara: prestar assistência corporal e espiritual a todos os que sofrem, especialmente aos doentes, deficientes, pobres e excluídos.
Ao longo dos séculos, a Ordem espalhou-se pelo mundo, fundando hospitais, lares, escolas e centros de apoio em mais de 50 países. O seu trabalho é reconhecido pela qualidade dos cuidados e pela dedicação dos religiosos e colaboradores leigos que partilham do mesmo carisma.
A presença em Portugal
Portugal desempenha um papel especial na história desta Ordem, por ser a terra natal do fundador. Já no século XVII existiam casas e hospitais sob o espírito de São João de Deus, como em Lisboa e no Porto.
Em 1606 foi fundado o primeiro núcleo da ordem em Portugal, em Montemor-o-Novo, terra natal de São João de Deus, tendo esta comunidade sido transformada numa província em 1671. A devoção ao santo cresceu sobretudo a partir da sua canonização em 1690.
Após um período de declínio ao longo do século XIX, a comunidade portuguesa foi restaurada em 1893, embora a província só tenha reiniciado as suas funções em 1928. No seguimento da Revolução de 1974 em Portugal, a ordem esteve em risco de perder o seu património imóvel, pelo que encetou esforços no sentido de integrar juridicamente os seus estabelecimentos de saúde e de assistência, além das funções dos membros da irmandade e dos profissionais a seu cargo.
Contudo, o verdadeiro impulso moderno em Portugal surgiu no século XX, quando a 11 de Novembro de 1977 foi fundado o Instituto São João de Deus, que tinha como função administrar os vários estabelecimentos de saúde que pertenciam à província nacional da Ordem Hospitaleira, tendo trazido um novo dinamismo ao carisma hospitaleiro no nosso país.
O Instituto São João de Deus em Portugal
O Instituto São João de Deus (ISJD) nasceu em Lisboa em 1977, num contexto de grandes dificuldades. Para salvaguardar e dar continuidade à missão de São João de Deus em Portugal, os irmãos da Ordem criaram esta estrutura civil, reconhecida oficialmente, que lhes permitiu manter as suas obras abertas e desenvolver novas iniciativas de caridade.
Principais objetivos do Instituto:
- Garantir a assistência a doentes mentais e físicos;
- Cuidar de pessoas em situação de exclusão social;
- Apoiar famílias em dificuldades;
- Gerir hospitais, centros de saúde e lares em território português.
Com o passar dos anos, o Instituto expandiu-se, tendo estabelecido várias casas e serviços em cidades como Lisboa, Fátima, Telhal, Idanha, Barreiro, Parede e Madeira. O Hospital de São João de Deus, no Telhal, fundado em 1893 e integrado no Instituto, é hoje uma referência nacional na área da saúde mental.
Reconhecimento e impacto
O Instituto São João de Deus é reconhecido pela sociedade portuguesa não apenas como instituição de saúde, mas também como obra profundamente inspirada pelo Evangelho. A conjugação entre profissionalismo médico e cuidado espiritual é um dos traços distintivos da sua ação.
Muitos dos seus estabelecimentos são considerados de excelência, tanto pelo Estado português como pela Santa Sé, representando um elo entre a tradição cristã de hospitalidade e as exigências modernas da medicina.
Espiritualidade e legado
A espiritualidade da Ordem e do Instituto continua centrada na figura de São João de Deus, cujo testemunho recorda que cada pessoa doente deve ser acolhida como o próprio Cristo. O símbolo da Ordem, a granada com cruz, é sinal de unidade e amor universal, lembrando também a cidade onde o santo viveu a sua missão.
O Instituto São João de Deus mantém-se hoje como uma das expressões mais vivas da presença do santo português no mundo contemporâneo, servindo de ponte entre a tradição e a modernidade, entre a fé e a ciência, sempre em favor dos mais frágeis.
Conclusão
A Ordem Hospitaleira de São João de Deus, com a criação do Instituto São João de Deus em 1977, assegurou a continuidade da obra do santo em Portugal e tornou-se um verdadeiro farol de hospitalidade cristã. A sua ação lembra-nos que a caridade, quando vivida com autenticidade, transforma vidas e renova a sociedade.
Mais de 400 anos após a sua fundação, a Ordem continua a cumprir fielmente o apelo de São João de Deus: “Fazer o bem, bem feito, por amor de Deus e do próximo”.