Ao longo de dois milénios de história, a Igreja Católica viveu momentos decisivos que definiram o rumo da fé, da liderança e da própria identidade eclesial. Entre esses momentos, os Conclaves destacam-se como episódios cruciais e profundamente simbólicos: são o processo de eleição do sucessor de São Pedro, o Papa. Desde a institucionalização deste método no século XIII, alguns Conclaves ficaram marcados pela sua duração, tensões políticas, repercussões históricas ou surpresas inesperadas.
O que é um Conclave?
A palavra “Conclave” deriva do latim cum clave (“com chave”) e designa o processo eleitoral reservado aos cardeais para escolher o novo Papa. Desde 1274, após o Concílio de Lyon II, que os cardeais eleitores são obrigados a reunir-se em isolamento absoluto, sem contacto com o exterior, para evitar influências políticas e assegurar um discernimento espiritual livre.
1. O Conclave mais longo da história: Viterbo (1268–1271)
Após a morte do Papa Clemente IV, os cardeais levaram quase três anos para eleger um sucessor. O Conclave decorreu na cidade de Viterbo, em Itália, e ficou paralisado por disputas entre facções francesas e italianas.
Cansados da demora, os cidadãos da cidade trancaram literalmente os cardeais, removeram o teto do palácio e reduziram as suas rações de comida. A pressão resultou, finalmente, na eleição de Gregório X, que viria a reformar profundamente o processo com a introdução de regras para isolar os cardeais — instituindo oficialmente o Conclave como o conhecemos hoje.
2. O Conclave que quase causou um cisma: Urbano VI (1378)
Este Conclave foi realizado em Roma sob forte pressão popular. O povo romano exigia um Papa italiano, após décadas de domínio francês. Diante da ameaça de motins, os cardeais elegeram Bartolomeu Prignano, que tomou o nome de Urbano VI.
No entanto, logo após a eleição, muitos cardeais alegaram ter sido coagidos e declararam a eleição inválida. Reuniram-se noutro Conclave e elegeram o antipapa Clemente VII, iniciando o chamado Cisma do Ocidente, que dividiu a Igreja durante quase 40 anos, com dois (e depois três) papas simultaneamente.
3. O Conclave da renúncia: Gregório XII e o Concílio de Constança (1417)
Este não foi um Conclave nos moldes tradicionais, mas um momento extraordinário na história da Igreja. Após o longo cisma, três homens reclamavam o trono de Pedro. Foi necessário um concílio ecuménico — o de Constança — para resolver o impasse.
O Papa Gregório XII renunciou, e os outros dois foram depostos. O concílio, com participação dos cardeais e representantes dos reis cristãos, elegeu Martinho V, reunificando finalmente a Igreja sob um só pontífice.
4. O Conclave mais rápido: Pio XII (1939)
Após a morte de Pio XI, os cardeais reuniram-se no Vaticano e, em apenas três votações, elegeram o cardeal Eugenio Pacelli como Pio XII, em apenas dois dias.
A eleição rápida foi vista como sinal de unidade entre os cardeais face às ameaças da guerra iminente. Pio XII conduziu a Igreja durante o período difícil da Segunda Guerra Mundial.
5. O Conclave mais internacional: João Paulo II (1978)
Após a morte de João Paulo I, que reinou apenas 33 dias, os cardeais reuniram-se para um Conclave que marcaria a história moderna da Igreja. Foi eleito o cardeal polaco Karol Wojtyła, que assumiu o nome de João Paulo II.
Foi o primeiro Papa não italiano em 455 anos, e a sua eleição foi uma surpresa total para o mundo. O seu pontificado duraria 27 anos e teria um impacto global, sobretudo na queda do comunismo na Europa de Leste.
6. O Conclave mais tecnológico: Bento XVI (2005)
Com a morte de João Paulo II, a Igreja organizou um dos Conclaves mais acompanhados mediaticamente da história. A presença maciça de jornalistas, câmaras e o uso generalizado da internet marcaram esta eleição.
O eleito foi o cardeal alemão Joseph Ratzinger, que adoptou o nome de Bento XVI. Foi o primeiro Papa alemão em quase mil anos.
7. O Conclave da renúncia papal moderna: Francisco (2013)
A renúncia de Bento XVI, em 2013, foi um dos acontecimentos mais marcantes da história recente da Igreja — a primeira renúncia papal voluntária em mais de seis séculos. O Conclave seguinte foi rápido, e os cardeais escolheram o cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio, que se tornou o primeiro Papa jesuíta, o primeiro latino-americano e o primeiro a adoptar o nome Francisco.
A sua eleição simbolizou uma nova abertura pastoral e geográfica da Igreja.
Conclusão
Os Conclaves não são apenas momentos eleitorais — são capítulos vitais da história da Igreja Católica. Ao longo dos séculos, estes encontros revestiram-se de espiritualidade, mas também de tensão, política e reforma. Cada Conclave reflecte os desafios do seu tempo, e a eleição de um novo Papa é sempre um novo início, cheio de esperança e de responsabilidade.
A história mostra que os Conclaves não são apenas votações, mas momentos de discernimento profundo, onde se cruzam tradição, oração, humanidade e, como a fé católica acredita, a acção do Espírito Santo.