A Capelinha das Aparições, erguida no local onde Nossa Senhora apareceu aos três pastorinhos em 1917, é o coração espiritual do Santuário de Fátima e símbolo da devoção mariana em Portugal e no mundo. Contudo, poucos sabem que este lugar sagrado foi alvo de um atentado com explosivos em 1922, quando uma bomba destruiu parcialmente a capelinha. O episódio, longe de abalar a fé dos fiéis, acabou por reforçar a devoção e consolidar a importância de Fátima como espaço de oração, sacrifício e conversão.
As origens da Capelinha das Aparições
Após as aparições de Nossa Senhora, entre maio e outubro de 1917, o terreno da Cova da Iria, em Fátima, tornou-se um local de peregrinação espontânea. Sem estrutura ou autorização eclesiástica, os fiéis começaram a reunir-se para rezar o Rosário e prestar homenagem à “Senhora mais brilhante que o sol”.
Em 1919, por iniciativa de uma devota local, Maria Carreira, conhecida como Maria da Capelinha, foi construída uma pequena ermida no local exato das aparições. A obra, simples e feita em madeira e pedra, foi concluída a 13 de junho de 1919, e tornou-se rapidamente o primeiro espaço visível da devoção nascente a Nossa Senhora de Fátima.
Foi ali que, dois anos depois, a primeira Missa oficial seria celebrada — a 13 de outubro de 1921 —, com autorização do bispo de Leiria, D. José Alves Correia da Silva.
O contexto do atentado
A década de 1920 em Portugal foi marcada por forte instabilidade política e anticlericalismo, herança da Primeira República. Muitos setores republicanos e laicistas viam com desconfiança e até hostilidade a crescente popularidade das aparições de Fátima, considerando-as um retrocesso supersticioso numa sociedade que pretendia ser moderna e racional.
À medida que as multidões aumentavam e os relatos dos milagres se espalhavam, o fenómeno de Fátima começou a incomodar os círculos políticos mais radicais, que viam no culto à Virgem um símbolo de resistência católica à ideologia anticlerical do Estado.
Foi neste ambiente de tensão e hostilidade que, a 6 de março de 1922, a Capelinha das Aparições foi atacada com explosivos, num ato de profanação que abalou os fiéis mas acabou por consolidar ainda mais a sua fé.
O ataque à Capelinha
Na madrugada de 6 de março de 1922, indivíduos não identificados colocaram uma bomba de fabrico artesanal junto à Capelinha das Aparições. A explosão destruiu parcialmente o pequeno edifício, partindo o altar e derrubando parte das paredes.
Segundo os testemunhos da época, o local ficou coberto de destroços e cinzas. O sacrário e os objetos litúrgicos usados nas celebrações ficaram danificados. A imagem original de Nossa Senhora de Fátima, felizmente, não se encontrava no local nesse momento, pois havia sido retirada para segurança e guardada na casa da família Carreira.
O ataque foi interpretado como um ato de ódio contra a fé e contra o crescimento das peregrinações que já começavam a transformar Fátima num fenómeno religioso de dimensão nacional. A autoria nunca foi oficialmente descoberta, mas acredita-se que tenha sido praticado por grupos anticlericais ativos na região.
Reação do povo e impacto espiritual
A destruição da capelinha, longe de enfraquecer a devoção, provocou uma onda de comoção e solidariedade entre os fiéis.
Milhares de católicos de todo o país manifestaram apoio à reconstrução e enviaram donativos. Muitos viram no ataque um sinal de que a fé em Fátima incomodava as forças do mal, e que a própria Virgem estava a ser perseguida através dos seus devotos.
O bispo de Leiria condenou o ato e incentivou a reconstrução imediata da capelinha, declarando que “a fé não se destrói com dinamite”.
Pouco tempo depois, as obras foram iniciadas, com o apoio dos peregrinos e da população local.
A reconstrução da Capelinha
A Capelinha das Aparições foi reconstruída poucos meses depois, mantendo as suas dimensões originais e o mesmo estilo simples, de acordo com o desejo dos fiéis e da Diocese de Leiria.
A nova capelinha foi reinaugurada ainda em 1922, tornando-se rapidamente um símbolo de resistência espiritual e da vitória da fé sobre o ódio.
Os anos seguintes confirmaram o papel central deste pequeno edifício: em 1927, o bispo de Leiria abençoou solenemente o recinto das aparições, e em 1930, a Igreja Católica reconheceu oficialmente as aparições de Fátima, legitimando o culto e as celebrações na Cova da Iria.
O local que havia sido destruído pela bomba tornou-se, paradoxalmente, o epicentro da fé mariana em Portugal e no mundo.
A Capelinha na atualidade
Hoje, a Capelinha das Aparições continua a ser o coração do Santuário de Fátima, preservando o altar sobre o qual Nossa Senhora apareceu. O edifício mantém a simplicidade das suas origens, mesmo com as melhorias estruturais necessárias para acolher os milhões de peregrinos que ali acorrem anualmente.
O local do atentado, muitas vezes esquecido, é lembrado pelos historiadores como um momento decisivo na consolidação da devoção a Nossa Senhora de Fátima — quando a fé, ameaçada pela violência, respondeu com oração, reconstrução e perseverança.
Conclusão
O atentado de 6 de março de 1922 à Capelinha das Aparições de Fátima é um dos episódios mais marcantes da história do Santuário. Aquilo que os agressores quiseram destruir acabou por se tornar ainda mais forte: a fé do povo português e a devoção à Mãe de Deus.
A Capelinha renasceu das cinzas, como sinal de que a esperança cristã não pode ser destruída pela violência, e que a mensagem de Fátima — de oração, penitência e conversão — continua viva e atual, mesmo diante da adversidade.
“A fé é o escudo que resiste às tempestades do mundo. Nenhuma bomba pode destruir o amor que nasce da oração.”
(Inspiração popular atribuída aos peregrinos de Fátima após o atentado de 1922)